Policial é deixada nua e revistada à força
Acorda Cidade
A Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB-SP) informou nesta terça-feira (22) que comunicou o governo paulista em novembro do ano passado sobre a existência do vídeo que mostra delegados da Corregedoria da Polícia Civil despindo à força uma escrivã suspeita de corrupção dentro de uma delegacia na capital paulista. As imagens com a ação, ocorrida em 15 de junho de 2009 no 25º Distrito Policial, em Parelheiros, na Zona Sul, vazaram e foram parar recentemente na internet.
A reportagem teve acesso aos ofícios que o presidente da OAB-SP, Luiz Flávio Borges D´Urso, disse ter encaminhado em 4 de novembro ao então governador Alberto Goldman, ao presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) na época, o desembargador Antônio Carlos Viana Santos, morto em 26 de janeiro deste ano, ao procurador geral de Justiça de SP, Fernando Grella Vieira, e ao secretário da Segurança Pública, Antonio Ferreira Pinto.
Nos documentos, assinados por D´Urso, ele escreve que entrega às autoridades “cópia de ofício, bem como de DVD (...) para as providências que julgar cabíveis” em relação às cenas gravadas pela Corregedoria. O advogado Fábio Guedes, que defende a ex-escrivã, disse ter enviado fragmentos do vídeo à entidade em 18 de outubro do ano passado.
Em nota divulgada nesta terça, a OAB informou que havia fornecido cópia das cenas obtidas em que os agentes da Corregedoria tiram a calça e a calcinha da escrivã por entender que houve violação da lei na revista feita por homens. Segundo a ordem, somente uma policial feminina pode fazer esse tipo de vistoria.
"A Corregedoria pode abrir precedentes ao avaliar como positiva a ação policial diante da revista à escrivã, que foi deixada nua à força por colegas dentro de uma delegacia de São Paulo. O processo foi realizado por homens, fato que chamou a atenção da OAB, por violar a lei”, disse a entidade na nota.
Governo
A reportagem procurou a assessoria de imprensa do governo paulista para comentar o assunto. Segundo a assessoria de imprensa, o documento da OAB não foi localizado até o início da noite desta terça.Na segunda, o governador eleito Geraldo Alckmin (PSDB) classificou como “grave” o vazamento do vídeo da ação da corregedoria contra a escrivã.
TJ-SP
A assessoria do Tribunal de Justiça disse que o documento da OAB foi arquivado, pois o órgão constatou que tanto a Secretaria da Segurança Pública como o Ministério Público haviam recebido o material, aos quais competiam as investigações. O atual presidente em exercício do TJ-SP é Antônio Luiz Reis Kuntz.
Ministério Público
A reportagem também entrou em contato com a Procuradoria-Geral de Justiça. Segundo o órgão, o procurador Grella Vieira está em viagem fora de São Paulo. O Ministério Público Estadual de São Paulo disse que vai apurar se os quatro delegados da Corregedoria da Polícia Civil, responsáveis por investigar ilegalidades praticadas por policiais, e outros agentes públicos cometeram abuso de autoridade contra uma então escrivã dentro de uma delegacia na capital paulista.
A Promotoria de Justiça instaurou procedimentos para apurar a denúncia a partir das notícias veiculadas na imprensa.
Segundo a Procuradoria, o caso “já é objeto de investigação” dos promotores do Grupo de Atuação Especial de Controle Externo da Atividade Policial (Gecep), do Ministério Público. Segundo a assessoria de imprensa do MP, a Procuradoria recebeu uma representação em dezembro de 2010 para a reabertura das investigações sobre o fato e o encaminhou ao Gecep.
Os outros promotores que irão apurar o caso são da Promotoria do Patrimônio Público e Social. Segundo o MP, na segunda-feira (21), o órgão “instaurou procedimento para apurar a possível ocorrência de abuso e ilegalidade, além da prática de atos de improbidade administrativa por parte de delegados de polícia e outros agentes públicos, naquela ocorrência”.
De acordo com esse procedimento, os agentes policiais, sob a alegação de realizar revista e prisão da escrivã, por suposto crime de corrupção, “submeteram-na a forte humilhação e violência, utilizando-se de força bruta para algemá-la, despi-la e expor suas partes intimas na presença de quem estivesse na sala, muito embora a mesma jamais se recusasse a ser revistada ou mesmo despir-se, desde que na presença e por outras mulheres”.
SSP
O secretário da Segurança Pública, Antonio Ferreira Pinto, disse ter recebido o material da Casa Civil do governo no dia 22 de dezembro de 2010.
Ao identificar o material como sendo de interesse da Corregedoria da Polícia Civil, Ferreira afirmou que enviouu para o órgão no mesmo dia, "cumprindo sua obrigação funcional".
"Registre-se que secretário não assistiu ao conteúdo do vídeo naquela ocasião e, na data em que o vídeo chegou à secretaria, o fato já havia sido investigado pela Corregedoria e arquivado pelo juiz 19 de novembro de 2009", diz nota da secretaria.
Ferreira Pinto determinou o afastamento de dois delegados lotados na Corregedoria da Polícia Civil.
Com a divulgação do vídeo na internet e sua repercussão, o secretário também determinou a nova instauração de processo administrativo disciplinar na Corregedoria da Polícia Civil para apurar a responsabilidade dos delegados envolvidos naquela ação de 2009. No sábado (19), a corregedora Maria Inês Trefiglio Valente disse que não houve abuso e que os policiais agiram "dentro do poder de polícia".
Durante a apuração do MP na época dos fatos, um promotor disse que despir a então escrivã foi consequência do transcorrer da operação policial contra ela.
Ainda na nota, o secretário da Segurança Pública informou que enviará ofício ao chefe do Ministério Público "manifestando perplexidade com o requerimento de arquivamento do inquérito policial instaurado por abuso de autoridade, pelo representante do Ministério Público oficiante, à época, junto ao juízo criminal da Vara Distrital de Parelheiros".
O caso
Em 15 de junho de 2009, a ex-escrivã, atualmente com 29 anos, teve a calça e a calcinha arrancadas à força na presença dos delegados da corregedoria, de uma policial militar e uma guarda municipal dentro do 25º DP. A equipe da Corregedoria a investigava por crime de concussão (quando um servidor exige o pagamento de propina). Ela era acusada de cobrar R$ 200 de um suspeito de porte ilegal de arma para favorecê-lo no inquérito.
Para conseguir flagrar esse dinheiro, a Corregedoria obrigou a escrivã a tirar a roupa na frente de policiais homens. Ela se recusou e disse que só se despiria na presença de mulheres. Mas um delegado disse que era preciso a presença dele na sala para que a escrivã não alegasse que a PM e a GM forjaram a prova do crime, caso encontrassem algum dinheiro com ela.
Nenhuma policial feminina da corregedoria surgiu para acompanhar a operação. Mesmo assim, os policiais homens a algemaram com as mãos para trás. Em seguida, a jogaram no chão, a seguraram e abaixaram suas roupas, deixando-a nua da cintura para baixo. Toda essa ação foi gravada pela corregedoria. Doze de um total de 45 minutos do vídeo caíram recentemente na internet e foram parar no site Youtube.
Nas imagens, logo após a escrivã ficar seminua, o delegado responsável pela investigação aparece com quatro notas de R$ 50 e dá voz de prisão à escrivã. À época, ela cursava o 5º ano de direito. A mulher respondeu a processo administrativo e foi exonerada da Polícia Civil em outubro de 2010. A corregedoria concluiu que os delegados envolvidos na ação agiram com “moderação” e arquivaram o inquérito contra os policiais. Eles alegaram que o vídeo da operação policial contra ela mostra as tentativas de que ela se deixasse revistar sem o uso da força.
O advogado da ex-escrivã tenta reverter sua exoneração da Polícia Civil. O inquérito criminal ainda corre na Justiça. A primeira audiência do caso só deverá ocorrer em maio, conforme seus advogados.
"Foi um excesso desnecessário. Ela só não queria passar pelo constrangimento de ficar nua na frente de homens", disse o advogado Fábio Guedes da Silveira.
Em entrevista na segunda, a ex-escrivã, que não quis ter o nome divulgado, afirmou que se sente humilhada em dobro com a veiculação do vídeo na internet com a cena dentro da delegacia. “É uma dupla humilhação, no dia e agora”, disse a mulher, que preferiu não comentar a acusação.
A reportagem não conseguiu localizar os delegados afastados da corregedoria pelo secretário para comentar o assunto. As informações são do G1
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