Anencefalia: STF praticamente decide pela interrupção da gravidez

A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, na tarde desta quinta-feira (12), que a mulher tem direito a escolher interromper gestação de feto anencéfalo. A confirmação veio após voto do ministro Carlos Ayres Britto, o sexto a se posicionar favorável à ação movida pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), que defende a interrupção da gravidez nesses casos.

Os seis ministros favoráveis acompanharam a tese do relator, Marco Aurélio Mello, que entende que a mulher que optar pelo fim da gestação de bebê anencéfalo (malformação do tubo neural, do cérebro) poderá fazê-lo sem ser tipificado como aborto ilegal. Atualmente, a legislação permite o aborto somente em caso de estupro ou risco à saúde da grávida. Fora dessas situações, a mulher pode ser condenada de um a três anos de prisão e o médico, de um a quatro anos. Nos últimos anos, mulheres tiveram de recorrer a ordens judiciais para interromper esse tipo de gestação.

Mais três ministros ainda irão votar – Gilmar Mendes, Celso de Melo e Cezar Peluso. Os votos já dados podem ser mudados enquanto não for concluído o julgamento, entretanto, o resultado é considerado praticamente certo. Além de Britto, votaram a favor os ministros Marco Aurélio Mello, Rosa Weber, Joaquim Barbosa, Luiz Fux e Cármen Lúcia. O único contrário, até o momento, foi Ricardo Lewandowski.
Relator da ação movida pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), o ministro Marco Aurélio Mello foi o primeiro a votar. Em mais de duas horas, ele argumentou que deve ser garantido o direito da mulher de escolher se quer interromper a gestação de um feto com anencefalia.
“Estão em jogo a privacidade, a autonomia e a dignidade humana dessas mulheres. Hão de ser respeitadas tanto as que optem por prosseguir a gravidez quanto as que prefiram interromper a gravidez para pôr fim ou minimizar um estado de sofrimento. Não se pode exigir da mulher aquilo que o Estado não vai fornecer por meio de manobras médicas”, disse. O relator defendeu a “antecipação terapêutica do parto”, o que considera diferente do aborto, pois a Constituição só autoriza em caso de estupro e riscos à saúde da grávida.

A ministra Rosa Weber também acompanhou o voto de Marco Aurélio Mello, alegando a defesa do direito reprodutivo feminino. “Não está em jogo o direito do feto, mas da gestante. A proibição da antecipação do parto fere a liberdade de escolha da gestante que se encontra na situação de carregar o feto anencéfalo em seu ventre”.

Após Weber, Joaquim Barbosa também se posicionou favoravelmente à interrupção da gravidez nessas situações. Luiz Fux, o quarto voto a favor da ação, alegou que é injustiça condenar uma mulher à prisão por ela optar pelo fim da gravidez de um feto sem chance de sobreviver fora do útero. Com exceção das situações previstas em lei, a gestante que fizer um aborto pode ser condenada de um a três anos de prisão, e o médico, de um a quatro.

“É justo colocar essa mulher no banco do júri como se fosse a praticante de um delito contra a vida? Por que punir essa mulher que já padece de uma tragédia humana?”, indagou Fux.

Em seguida, a ministra Cármen Lúcia acompanhou os colegas. "A mulher que não pode interromper essa gravidez tem medo do que pode acontecer - o medo físico, psíquico e de vir a ser punida penalmente", alegou. .

Último a votar na sessão dessa quarta-feira, Ricardo Lewandowski manifestou-se contrário. Segundo ele, permitir o aborto de um anencéfalo pode criar brecha para "a interrupção da gestação de inúmeros outros embriões que sofrem ou venham a sofrer outras doenças, genéticas ou adquiridas, as quais, de algum modo, levem ao encurtamento de sua vida intra ou extrauterina”.

Na sessão de ontem, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, esclareceu que caso a ação seja aprovada, ela não será uma obrigação para as mulheres. Aquelas que desejarem seguir com o parto estão resguardadas.  “Não está se afirmando que a mulher deve [interromper a gravidez]”, destacou.

O advogado Luiz Roberto Barroso, que representa a CNTS, sustentou que “a criminalização da interrupção da gestação quando o feto não é viável viola os direitos das mulheres”. Advogados contrários à aprovação da medida também apresentarão suas posições.

Do lado de fora do STF, grupos religiosos contrários à legalização do aborto de anencéfalos fizeram uma vigília e orações pela não aprovação da medida

Postar um comentário

0 Comentários