Pouco
mais de um ano após a morte do filho, assassinado por policiais
militares do 41º BPM (Irajá) em dezembro de 2018, Laura Ramos de
Azevedo, de 37 anos, ainda guarda a dor e as lembranças da perda do seu
único filho. Hoje, data em que é celebrado o Dia Internacional Contra a
Violência Policial, a mulher ainda espera por uma solução.
—
Trabalhei 12 horas por dia, inclusive aos fins de semana, para pagar um
colégio particular bom para o Lucas. Não ofereci uma boa educação para
no fim ele ser morto brutalmente. Se meu filho fosse branco de olhos
claros, morasse na Zona Sul, não teria sido morto da forma como foi. E
se fosse, já teriam respostas a dar — lamenta ela.
Dados
obtidos com a Polícia Militar, via Lei de Acesso à Informação, revelam
que, de 2008 a 2018, 347 policiais foram licenciados ou expulsos da
corporação por crimes como homicídio, lesão corporal, agressão, atentado
violento ao pudor, estupro, violação de domicílio e tortura: são cerca
de 30 agentes afastados por ano, quase um a cada 12 dias.
Números
do Instituto de Segurança Pública (ISP) mostram que as mortes causadas
por agentes do Estado subiram 335% nos últimos sete anos no Rio de
Janeiro: passou de 416 pessoas, em 2013, para 1.810, no ano passado.
Os
números do ISP, porém, indicam que a taxa reduziu pouco mais de 4% se
comparados janeiro do ano passado (159 casos) com o mesmo mês deste ano
(152).
— Há décadas, a política de segurança pública
no Rio prioriza o enfrentamento como forma de combater a criminalidade, o
que gera mais violência. Soma-se a isso a perda do respeito por parte
dos moradores que, nesse cenário, traz efeitos colaterais como a morte
de inocentes. Assim, a polícia se distancia mais da realidade nas
favelas — afirma o especialista em Segurança Pública José Ricardo
Bandeira.
Segundo relatório anual da Anistia
Internacional, autoridades adotaram a "retórica de linha-dura que
alimentou uma violência crescente contra a população, com intervenções
policiais militarizadas caracterizadas por nível elevado de violência,
por crimes contra o direito constitucional e por violações dos direitos
humanos", aponta.
Confrontos não reduzem os homicídios
Em
setembro do ano passado, o Centro de Pesquisas do Ministério Público do
Rio de Janeiro (Cenpe/MPRJ) mostrou que o aumento do número de mortes
em ações policiais não tem relação direta com a redução da criminalidade
no estado. Em um ano, os homicídios dolosos tiveram queda de 21,5%,
enquanto mortes provocadas por policiais aumentaram cerca de 16% nesse
mesmo período.
A pesquisa, que dispunha de
estatísticas do ISP até agosto passado, mostrou que, das 39 áreas
integradas, apenas Nova Iguaçu, Macaé, Angra dos Reis, Queimados e São
Gonçalo representavam, juntas, 42% da queda de homicídio do estado.
Entre estas, porém, só as duas últimas viram, até então, aumentar as
mortes nos chamados auto de resistência.
O estudo
destaca que, apesar da polícia do Rio ter sido a mais letal de 2018, com
uma taxa de 8,9 por 100 mil habitantes, o estado ocupou o 11º lugar em
relação a mortes violentas intencionais. “O Rio tem a polícia mais letal
do Brasil, embora não esteja dentre os dez estados mais violentos do
país”, enfatizou a pesquisa.
Dois tiros
Lucas
Azevedo Albino, de 18 anos, foi assassinado com dois tiros — um no
ombro e outro na cabeça — durante ação de policiais militares no
Complexo da Pedreira, Zona Norte do Rio. O inquérito segue sob segredo
de Justiça.
Em julho do ano passado, oito meses após o
crime, a Justiça decidiu manter os quatro PMs afastados de suas funções
policiais. Desembargadores da 4ª Câmara Criminal do TJ do Rio também
negaram o pedido da defesa para eles voltarem a portar armas.
O
Dia Internacional Contra a Violência Policial começou a ser celebrado
em 1997, por iniciativa de dois movimentos sociais da Suíça. Na ocasião,
duas crianças de 11 e 12 anos foram espancadas até a morte pela
polícia.
A Polícia Militar se pronunciou sobre os
dados de mortes em confronto: “As ações da Corporação são planejadas com
base em informações da área de inteligência e têm como preocupação
central a preservação de vidas. O confronto é uma opção dos criminosos,
que, de posse de armas de alto poder de destruição, disparam tiros em
direção à tropa sem medir consequências (...) Como resultado da ação
contínua e diária da Corporação, em parceria com outras forças de
segurança, os índices criminais estratégicos têm sofrido reduções
expressivas”
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