Nos últimos três anos, desenhos dos esquilos Tico e Teco se espalharam pelas favelas da Praça Seca, na Zona Oeste do Rio. Os grafites dos personagens da Disney acompanharam o avanço da milícia na região e fazem referência aos irmãos chefes do grupo paramilitar que, hoje, domina uma área que se estende pelos bairros de Campinho, Quintino, Cascadura e Tanque, além da Praça Seca. Tico é Leonardo Luccas Pereira, de 28 anos, também conhecido como Leléo; já Teco ou Playboy é Diego Luccas Pereira, de 33.
A expansão dos domínios da dupla se deu pela capacidade de articulação dos dois: nas agendas de seus celulares, há contatos de milicianos de outras regiões do estado, assassinos de aluguel, policiais militares e até traficantes com quem formaram uma aliança. Um dos chefes do Bonde do Tico e Teco — como a milícia é conhecida na região — foi preso no último dia 23. Após sete anos foragido, Diego foi capturado por agentes da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco) num apart-hotel na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio, com vista para o mar.
Segundo a polícia, entre os irmãos Playboy assumiu o lado assistencialista, “amigo” da comunidade: promovia eventos e distribuía benesses aos moradores. Já Leonardo é o articulador, responsável por buscar fornecedores de armas e munição para o grupo e montar uma rede de informações com policiais amigos. Leléo nunca foi preso.
A relação de ambos com a milícia vêm de berço. Eles são filhos do sargento da PM Goulart Vital Pereira, citado no relatório final da CPI das Milícias da Alerj, de 2008, como um dos integrantes do bando que dominava, à época, as favelas do Fubá e da Pedra Rachada, em Campinho. Goulart foi assassinado em março de 2011.
Os filhos não seguiram a carreira do pai, mas herdaram seu prestígio no submundo e contatos na corporação. PMs próximos à dupla não escondem a relação de amizade: em audiência no Fórum de Cascadura, dois policiais presos desde 2018 por suspeita de integrar a milícia dos irmãos alegaram que apenas eram “amigos de infância” da dupla.
Aliança com o tráfico
Amizades antigas também ajudaram os irmãos a costurar uma aliança importante com uma facção do tráfico para conseguir manter o controle da Praça Seca.
Mais de uma década antes de virar chefe do tráfico de drogas no Chapéu Mangueira, no Leme, Zona Sul do Rio, Paulo Roberto Silva Taveira, o Cara Preta, cresceu em Cascadura, na Zona Norte, reduto dos irmãos.
A ascensão do trio em quadrilhas diferentes — Cara Preta, na segunda maior facção do tráfico do estado, e Tico e Teco, na milícia — não impediu o contato entre os velhos amigos. Segundo a polícia, foi Cara Preta, preso em junho de 2019 no Complexo da Maré, quem apresentou os irmãos a seu comparsa Walace de Brito Trindade, o Lacoste, chefe do tráfico da Serrinha, em Madureira, em 2018.
Lacoste, Diego e Leonardo, então, fecharam uma aliança que foi responsável por manter a Praça Seca sob controle dos paramilitares até hoje.
O trato prevê o empréstimo de armas e homens do tráfico para a milícia usar em invasões de favelas e no reforço do território em caso de tentativas de tomada da Praça Seca pela maior facção do tráfico do estado. Em troca, os irmãos liberaram a venda de drogas nas áreas sob seu domínio.
Antes de ser preso, quatro dias relaxando
Playboy passou os dias que antecederam sua prisão relaxando numa pousada em Petrópolis, na Região Serrana. Ele chegou ao município, acompanhado da mulher, no dia 19, num Mitsubishi Outlander preto. Na pousada, apresentou uma identidade falsa em nome de Paulo Roberto Bastos Santos, e ficou num quarto com lareira e hidromassagem. A estadia durou quatro dias. Na terça, Playboy voltou ao Rio e, no dia seguinte, foi capturado.
Preso, Diego finalmente será julgado pelo duplo homicídio pelo qual responde há sete anos. Ele é acusado de executar dois homens que foram capturados pela milícia após roubarem na região da Praça Seca. A participação de Diego veio à tona após uma operação da Polícia Civil, em 2012, no Morro do Fubá. Na ocasião, os agentes apreenderam um carro e encontraram, em seu interior, uma identidade de Diego e um carregador com munição — do mesmo tipo, calibre e modelo usados na execução das vítimas.
A partir da prisão de Playboy, a polícia também espera esclarecer a participação dos dois irmãos no Escritório do Crime, quadrilha de matadores de aluguel fundada pelo ex-capitão do Bope Adriano Magalhães da Nóbrega, o Capitão Adriano, morto no início do ano na Bahia. A Polícia Civil já sabe que o homicídio do major da PM Alan Luna, em Nova Iguaçu, em 2018, foi obra do grupo. O carro usado pelos pistoleiros foi escondido no Morro do Fubá.
Fonte:Extra o Globo
0 Comentários