Primas mortas por bala perdida em Duque de Caxias são enterradas sob forte comoção

 Pai da Emilly carrega o caixão da filha, que foi enterrada na gaveta ao lado de sua prima


O enterro das primas Rebecca Beatriz Rodrigues Santos, de 7 anos, e Emilly Victoria da Silva Moreira Santos, de 4, foi marcado por grande comoção. As duas foram sepultadas lado a lado, na tarde deste sábado, no Cemitério Nossa Senhora das Graças, em Duque de Caxias. Cerca de 200 pessoas, entre parentes e amigos estiveram no local para dar adeus às meninas, que morreram vítimas de bala perdida, na noite desta sexta-feira, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Elas brincavam em frente ao portão de casa, na comunidade do Barro Vermelho, em Gramacho, quando aconteceu o tiroteio.

Alexsandro fecha o túmulo da filha e da prima da menina com as próprias mãos
Alexsandro fecha o túmulo da filha e da prima da menina com as próprias mãos Foto: Pedro Teixeira / Agência O Globo

Emily, que faria 5 anos, no próximo dia 23, foi enterrada com a roupa da Moana, princesa da Disney, que seria tema de sua primeira festinha de aniversário. Várias crianças estiveram no cemitério, muitas chorando e segurando flores. O pai da menina, Alexsandro dos Santos, passou mal e teve que ser amparado. No momento do sepultamento, ele fechou o túmulo da filha com as próprias mãos e de Rebeca também, que era sua sobrinha.


"Estamos enterrando mais uma vítima da violência na nossa comunidade. Duas crianças. Minha filha e minha sobrinha. Está aí os governadores que só querem ganhar dinheiro nas costas dos outros. Estou enterrando a minha filha, que não viveu nada", afirmou Alexsandro.

Criança chora a morte de Emilly Victoria e Rebeca Beatriz
Criança chora a morte de Emilly Victoria e Rebeca Beatriz Foto: Pedro Teixeira / Agência O Globo

Entenda o caso:

As primas Rebecca Beatriz e Emily Victoria, de acordo com familiares, brincavam em frente ao portão de casa, na comunidade do Barro Vermelho, em Gramacho, quando aconteceu o tiroteio. Avó de Rebecca e tia de Emilly, Lídia da Silva Moreira Santos conta que viu policiais atirarem da viatura em direção à rua e que não houve confronto com criminosos. Segundo ela, a mesma bala atingiu as duas crianças.

— Estava chegando do trabalho, por volta das 20h30, e quando desci do ônibus começaram os disparos.A rua estava cheia de crianças e pessoas chegando do serviço. Tinha uma viatura Blazer da PM parada em frente à rua e fizeram uns dez disparos de fuzil. Quando os policiais foram embora, atravessei e vi a Emilly atingida na cabeça, já sem vida. Depois minha nora veio gritando dizendo que tinham matado a Rebecca também. A mesma bala que pegou a Emilly atingiu o coração da Rebecca. Ela deu uns passos e caiu no quintal. Quando vi que ainda estava respirando, corri para a UPA de Sarapuí, mas já era tarde.

Muito abalada, Lídia diz que a família está em choque:

— Está todo mundo em choque. Os pais estão destruídos, eram meninas muito desejadas. A mãe da Emilly já tinha dois meninos e queria muito uma menina. Eu sempre quis uma filha e como só tive filhos homens, minha neta era tudo para mim. Ainda consigo falar e estou de pé para resolver as coisas, mas não sei o que será de mim quando eu parar. Isso não pode ficar impune. A culpa também é dos governantes que dizem que bandido bom é bandido morto e dão carta branca para a polícia, mas esquecem que na favela a maioria é trabalhador — declarou.

Em nota, a assessoria de imprensa da Secretaria de Estado de Polícia Militar informa nega que os policiais tenham feito disparos. De acordo com a PM, uma equipe policial do 15ºBPM (Duque de Caxias) estava em patrulhamento na Rua Lauro Sodré, altura da comunidade do Sapinho, quando disparos de arma de fogo foram ouvidos. "Não houve disparos por parte dos policiais militares. A equipe seguiu em deslocamento. Posteriormente, o batalhão foi acionado para verificar a entrada de duas pessoas feridas na UPA Caxias II (Sarapuí). No local, o fato foi constatado e tratavam-se de duas crianças", diz a nota.

O caso foi encaminhado para a Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense (DHBF). Segundo a Polícia Civil, diligências estão sendo feitas e a investigação está em andamento.

Repúdio à violência

A ONG Rio da Paz se pronunciou, através de suas redes sociais, sobre a violência contra as primas.

“Sempre que essas mortes ocorrem pensamos que tudo vai mudar, uma vez que a face mais hedionda da criminalidade no Rio é a morte por bala perdida desses meninos e meninas. Contudo, nada muda. Famílias permanecem desamparadas, a autoria dos homicídios não é elucidada, os assassinos não são punidos e nenhuma transformação ocorre na política de segurança pública. Vale lembrar que quem morre são crianças pobres. Nisso reside a razão da indiferença por por parte das autoridades públicas”, disse o presidente da ONG, Antonio Carlos Costa.

O Rio de Paz acompanha os casos de crianças mortas vítimas de armas de fogo desde 2007. A triste estatística, segundo a ONG, contabiliza, desde então, 79 acrianças vítimas da violência no Rio, a maioria delas por balas perdidas. Com esses casos, só este ano (2020), sobe para 12 o número de crianças mortas por armas de fogo no estado do Rio de janeiro até este sábado (5), ou seja, uma por mês, de acordo com estatísticas da ONG Rio de Paz. Em 2019, sete crianças foram assassinadas. Entre janeiro de 2019 (início do então governo Wilson Witzel) até este sábado (5/12) foram 19 crianças mortas
Pai da Emilly carrega o caixão da filha, que foi enterrada na gaveta ao lado de sua prima 
 
Fonte : Agência O Globo

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