A morte do soldado Wesley Soares, após ser neutralizado, no domingo (28/3), pelas equipes de negociação do Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE) da PM baiana, no Farol da Barra, deu margem a uma discussão entre os colegas de farda do militar, lotado na 72ª Companhia Independente (CIPM/Itacaré). Teria o gestor da crise esgotado todos os recursos, antes da decisão de atirar contra aquele soldado, aparentemente transtornado, fortemente armado, e em constante ameaça a quem estava no local?
Na manhã desta segunda-feira (29/3), colegas de Wesley fizeram uma rápida manifestação na unidade onde ele atuava. Eles protestaram, por conta da forma como foi tratada a situação do militar, pela instituição, e colocaram em dúvida a justificativa de que ele tenha apresentado um surto psicótico. "O que foi feito ontem foi desumano [...] O colega em momento algum feriu os policiais, feriu a sociedade. Ele falou que só queria que a população ouvisse e observasse o que um policial militar passa”, disse um dos manifestantes.
Segundo o comandante geral da Polícia Militar da Bahia, coronel Paulo Coutinho, a situação não permitia, inclusive pela distância, a utilização de uma pistola de condicionamento. “A tropa estava sendo atacada com uma arma de guerra, um fuzil. Efetivamente, é um potencial de letalidade grande”, pontuou.
Coutinho afirmou, ainda, que teriam sido obedecidas as normas estabelecidas pela doutrina internacional de gerenciamento de crises, que é adotada no Brasil, pelas tropas especiais em situações como essa.
Ponto de vista dos especialistas
De acordo com o especialista em Controle de Crises na Área de Segurança Pública, Osvaldo Emanuel, não houve exagero na atuação do Bope, já que Wesley disparou contra os policiais. “As negociações começaram desde a tarde e só aconteceu a ação no momento em que ele dá o tiro. Houve revide, quase que instantâneo”, mencionou.
Em relação ao questionamento dos colegas de Wesley, o especialista ponderou que quando acontece um fato dessa natureza, só os envolvidos no calor da emoção podem tomar as decisões. “Por mais que os companheiros queiram atribuir algum tipo de excesso à ação, fica até difícil pra eles, porque eu não saberia dizer qual seria a reação deles, se estivessem no caso”.
O antropólogo e ex-comandante do Bope do Rio de Janeiro, Paulo Storani, mesmo distante, acompanhou a situação que repercutiu em todo o Brasil e, também, conversou com a nossa reportagem. Especialista em negociação de conflitos, ele concorda com os colegas do soldado, acreditando não ter havido um surto psicótico nessa ocorrência.
“Ele não perdeu a noção de realidade. Sabia quem era e do que estava falando, apenas, tinha um comportamento alterado que poderia estar ligado ao uso de substância tóxica associada a bebida alcoólica, ou, então, estava em uma situação limite, devido a um problema pessoal ou pressão de trabalho”, avaliou.
Em uma análise mais aprofundada, Storani considerou outras alternativas, além da negociação, que fazem parte de uma solução de crise, baseadas na doutrina internacional. Ele pontuou a possibilidade da utilização de recursos como artefatos químicos ou armamentos não letais; atiradores de precisão; e o emprego da força tática.
Contudo, o ex-comandante ressaltou que quem cuida disso é o gerenciador da crise. “Ele é quem vai lançar mão dessas alternativas, a depender do cenário encontrado”. Mesmo sem ter vivido de perto a ação, Storani arriscou um palpite, diante de uma observação.
Baseado nas imagens que teve acesso, ele comentou que em vários momentos, houve a possibilidade da utilização de alternativas táticas, não, necessariamente, letais. “Eu vi que eles estavam ali, por exemplo, com um cão, que é muito bem empregado nisso. Se naquela situação que ele estava lá derrubando os cones, o cão é solto e logo atrás chega a equipe tática, o cão ia imobilizar o policial e ele iria sair vivo dessa”.
O ex-comandante acredita que o gerenciador da crise apostou que a negociação iria cansar o policial. Porém, chega o momento em que Wesley faz o disparo, quando o uso progressivo da força teve de ser usado, diante de uma ameaça letal.
Apesar disso, ele não descartou que o gestor da crise poderia ter usado, também, artefatos como bombas de efeito moral ou gás lacrimogênio pra atordoar e tirar a atenção de Wesley. “Isso não quer dizer que a decisão tenha sido ilegal. Eu não sei quais recursos estavam disponíveis naquela operação. Tinham meios e esses meios estavam disponíveis? Essa é uma pergunta que tem de ser feita”, cravou.
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