O governo da Bahia emitiu uma nota, nesta terça-feira (3), sobre o episódio em que o secretário de Saúde do estado, Fábio Vilas-Boas, xingou a chef de cozinha Angeluci Figueiredo, do tradicional restaurante Preta, de "vagabunda".
Na manhã desta terça, ao G1, o governo havia informado que não ia se manifestar sobre a situação. Por volta do meio dia, a gestão voltou atrás e emitiu uma nota em que afirma lamentar a agressão verbal.
"Por meio da Secretaria de Comunicação, o governo do estado afirma lamentar o episódio, considera inadmissível qualquer tipo de agressão e manifesta total solidariedade à empresária Angeluci Figueiredo e a todas as mulheres", disse a nota.
Agressão verbal
No último final de semana, a Capitania dos Portos recomendou a restrição de navegação na Baía de Todos-os-Santos, por causa da instabilidade do tempo e das variações do vento, o que causa má condição de navegação. Por causa da mesma recomendação, a travessia Salvador-Mar Grande também foi suspensa.
Diante da recomendação, a chef Angeluci optou por não abrir o restaurante e cancelar o atendimento. Com a suspensão, o secretário de Saúde então passou a ofendê-la por mensagens.
"Esqueça de me ver de novo aqui. E ainda paguei R$ 350 para desembarcar. "Amigo o caralho! Vagabunda", escreveu ele.
Depois de sofrer a agressão verbal, a chef Angeluci questionou a postura agressiva do secretário e os xingamentos.
"O que o autoriza, no exercício de uma função pública das mais relevantes do estado - a de secretário de Saúde do Estado da Bahia e, durante uma pandemia, o que torna a sua função sinhá mais responsável - chamar uma mulher de VAGABUNDA?", disse Angeluci.
"Os tempos mudaram, secretário: inexistem contextos que justifiquem essa relação de senhorio e vassalagem. Eu não sou vagabunda. Sou uma mulher digna, honrada, profissional, empresária, geradora de empregos e com uma árdua rotina de trabalho, física, inclusive, para realizar um sonho e um projeto de oferecer aos meus clientes um serviço de qualidade".
Angeluci também identificou o posicionamento de Vilas-Boas como misógino. Misoginia é a palavra usada para determinar a relação de ódio de homens para mulheres.
"O senhor sabe o que é ser misógino, secretário? Sabemos que sim, o senhor sabe. Mas sabemos que nesse país ninguém é racista, ninguém é misógino. Aqui não há nunca vítimas, só 'vitimismo' e 'mimimi', afinal devemos garantir que autoridades se sintam à vontade para sacar o telefone e chamar uma mulher de vagabunda, simplesmente porque pode, porque um desejo foi frustrado pelo tempo".
A chef também questionou se o secretário chamaria o dono de um restaurante de "vagabundo", caso a mesma situação ocorresse com um homem branco.
"O senhor sabe que não sou vagabunda, não sou irresponsável, não vivo de mesada de quem quer que seja e que, diferentemente do que o senhor me escreveu, eu preciso trabalhar", disse a chef.
Notas de repúdio
A Comissão de Proteção aos Direitos da Mulher da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Bahia (OAB-BA) e a Comissão da Mulher Advogada da OAB-BA divulgaram uma nota de repúdio contra o secretário de saúde do estado.
"Utilizando-se de aplicativo de mensagens, o referido agente público destilou machismo e misoginia contra uma mulher, negra, trabalhadora, ofendendo-a na sua honra, proferindo palavras de baixo calão e ameaças de exposição pública", disseram em nota.
O governador Rui Costa não se posicionou sobre a situação. A Secretaria de Mulheres do Partido dos Trabalhadores (PT), da qual ele faz parte, no entanto, também repudiou a agressão. Confira a nota na íntegra:
"A Secretaria de Mulheres do PT da Bahia vem a público prestar solidariedade à empresária Angeluci Figueiredo, que recentemente foi vítima de agressão verbal pelo secretário de Saúde do Estado, Fábio Villas Boas, em um ato que demonstra desrespeito, racismo, misoginia e machismo! O fato ocorrido traz para o centro problemas estruturais que fazem vítimas todos os dias em nosso estado e em nosso país, do qual nós, mulheres, somos obrigadas a lidar em nosso cotidiano, seja no campo pessoal ou profissional. Portanto, repudiamos atitudes como esta, sobretudo quando praticadas por gestor público, que tem o dever de combater todo o tipo de opressão. Fatos como este não podem repercutir apenas com pedidos de desculpas, mas, sobretudo, que sirva de exemplo para que não seja mais reproduzido! No projeto de sociedade que defendemos nunca coube e não cabe nenhum tipo de opressão e violência. Silenciadas nunca mais!".
O Conselho Baiano de Turismo (CBT) também repudiou o caso. Veja a nota:
"O CBTUR - Conselho Baiano de Turismo - repudia veementemente os atos ofensivos, desrespeitosos e truculentos manifestados pelo Secretário de Saúde do Estado da Bahia, Fábio Vilas Boas, no infeliz episódio ocorrido no último domingo, 01 de agosto de 2021, contra a empresária Angeluci Figueiredo, do Restaurante Preta. Tal atitude não pode permanecer impune! A chef foi agredida, imperdoavelmente, por parte de um secretário que deveria dar exemplo e respeito. A instituição é contra qualquer atitude misógina, preconceituosa, machista e elitista vinda de qualquer direção e se põe ao lado da empresária. Acreditamos no respeito mútuo e não toleramos mais sermos desrespeitados por aqueles que colocam posições de poder que ocupam acima do que é o certo e o errado. O Secretário Fábio Vilas Boas, mais uma vez, tentou impor sua vontade, perante o bom senso, a razoabilidade e a ciência. O ato extrapolou qualquer limite de respeito, humilhando e ameaçando não somente a Chef Angeluci Figueiredo, mas todas as mulheres trabalhadoras e empreendedoras. O CBTUR não poupará esforços para combater quaisquer atitudes desta natureza e não tolerará, em nenhuma hipótese, tais práticas. A instituição não aceita nenhum tipo de violência, e pede providências ao governador do Estado da Bahia, Rui Costa. Esperamos que o acontecido tenha o fechamento justo e necessário que merece!".
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