Partidos de diferentes lados do espectro político temem que os protestos de 7 de Setembro aumentem o tom autoritário de Jair Bolsonaro.
Entre auxiliares no Palácio do Planalto, há o temor de que o discurso do presidente, normalmente feito de improviso, seja inflamado diante das ruas cheias.
Por isso, eles têm atuado junto ao presidente para convencê-lo da importância de fazer uma fala mais moderada. Interlocutores acreditam que Bolsonaro pode se acalmar ao ver que tem ainda grande apoio da população.
A adesão às manifestações, dizem tanto aliados como adversários, será um divisor de águas para testar a força do presidente.
O receio, inclusive de parlamentares que são da base governista no Congresso, é que, se forem grandes, podem legitimar os ataques que ele tem feito ao STF (Supremo Tribunal Federal) e levá-lo a reforçar o discurso contra as instituições, podendo, inclusive, insistir no voto impresso, já derrotado pelo plenário da Câmara.
Um presidente de partido disse à Folha temer que seja instaurado um clima de estado de sítio, sobretudo por conta de uma eventual politização das polícias militares, que já colocou em alerta os governadores.
Por outro lado, se os protestos forem menores do que o esperado, poderiam ser o gatilho para manifestações contrárias a Bolsonaro —mesmo que o impeachment hoje tenha poucas chances de prosperar.
Ao mesmo tempo, a oposição começa a convocar nas redes sociais um panelaço nacional para as 19h do dia 7. "Em homenagem a 7% de inflação, 7% taxa de juros, 7 reais a gasolina, 70 reais o kg da carne, 7 reais kWh bandeira vermelha VAMOS FAZER 7 minutos de panelaço 7 da noite 7 de setembro", afirma postagem compartilhada com a hashtag #ForaBolsonaro.
Aliados do presidente esperam ato especialmente cheio na avenida Paulista, em São Paulo. A expectativa, dizem, é que seja maior do que os protestos pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) vistos em 2015 e 2016.
Para o presidente do PSB, Carlos Siqueira, não há dúvida de que Bolsonaro vai usar o episódio para cacifar o próprio discurso.
“Não tenha dúvidas, ele não vai deixar por menos. Diante de uma multidão, se houver essa quantidade [de pessoas], e provavelmente haverá, ele vai certamente quereruma radicalização. Ninguém consegue contê-lo, é ilusão”, disse Siqueira.
Para o dirigente do PSB, o país deveria estar mais preocupado em discutir a alta inflação, o preço do gás e da gasolina, entre outras questões.
O deputado Baleia Rossi (MDB-SP), presidente nacional da sigla, vai na mesma toada.
“Precisamos de bons exemplos dos nossos governantes. Radicalizar seria penalizar ainda mais à população mais pobre que já sofre com a inflação nos alimentos e os aumentos sucessivos nos combustíveis, gás e energia”, afirmou.
Os demais dirigentes partidários falaram à reportagem reservadamente. Apesar do temor da escalada de tom de Bolsonaro no dia seguinte ao feriado e da preocupação de governadores com insurgências nas suas PMs, eles reforçaram à Folha não ver risco de ruptura pela avaliação de que o Exército não encamparia uma "aventura Bolsonaro".
O chefe do Executivo já afirmou em entrevistas que falará nos dois protestos que participar, em Brasília e em São Paulo. No segundo, prevê um discurso mais longo.
Auxiliares palacianos trabalham intensamente para que após a data da Independência possa ser construída uma saída para a crise institucional.
A expectativa é pela retomada do encontro com os chefes dos Três Poderes, cancelado pelo presidente do STF, Luiz Fux, após repetidos ataques de Bolsonaro. O mandatário ainda protocolou pedido de impeachment de Alexandre de Moraes .
Ministros da área política do governo dizem que estão empenhados em reconstruir as relações depois do feriado. Acreditam que o presidente poderá usar o capital político das ruas para se tranquilizar e repactuar com o Legislativo e o Judiciário.
Confiante de que não haverá arroubos autoritários na fala do presidente nem confusão nas ruas, um ministro disse à Folha que, no dia seguinte às manifestações, todos voltarão a trabalhar normalmente, sem qualquer mudança de rota.
Enquanto isso, o STF —principal alvo dos ataques de Bolsonaro— está em compasso de espera. Interlocutores de Fux dizem não haver qualquer interesse no encontro enquanto o clima não amainar.
Fux aguarda os desdobramentos do 7 de Setembro para remarcar uma eventual reunião.
Apesar de interlocutores acreditarem que Bolsonaro tenha desistido, ao menos por ora, de apresentar pedido de afastamento do presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Luís Roberto Barroso, ainda há um temor de que ele mude de ideia, após pressão das ruas.
Em motociata em Goiânia na última sexta-feira (27) durante o expediente, Bolsonaro passeou pela multidão que gritava “Supremo é o povo”.
Mesmo que o mundo político dê como morta a discussão do voto impresso em Brasília, essa será uma das bandeiras levantadas por bolsonaristas no feriado.
A PEC (proposta de emenda à Constituição) sobre o tema foi derrotada no plenário da Câmara, com 229 deputados a favor e 218 contra.
Para ser aprovada, uma PEC precisa do apoio de 308 parlamentares. A proposta chegou ao plenário por determinação do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), porque já havia sido derrotada na comissão especial, que chancela o texto antes de todos analisarem.
O acordo de Lira com Bolsonaro era de que levaria o texto para o plenário e o mandatário respeitaria o resultado do painel de votação, o que não aconteceu exatamente —Bolsonaro continua defendendo a pauta.
O placar foi considerado uma vitória para governistas, que esperavam uma derrota com margem muito maior. Presidentes de 11 partidos se engajaram contra a proposta.
De acordo com interlocutores do presidente, contudo, a principal vitória de Bolsonaro com o placar do voto impresso não foi mostrar apoio que teve dos deputados, mas demonstrar que está bem posicionado na Câmara caso tentem emplacar eventual pedido de impeachment.
Para afastamento de um presidente, são necessários 342 votos. Para a PEC do voto impresso, Bolsonaro mobilizou apenas a base, não contou com esforços do centrão e nem da máquina, como emendas e cargos.
Mesmo excluindo alguns nomes da oposição que votaram a favor da proposta, como deputados do PSB, o presidente teria celebrado que precisaria de 113 votos para conseguir barrar um eventual processo. Lira já disse em mais de uma ocasião que não dará seguimento a nenhum dos mais de cem pedidos de impeachment de Bolsonaro.
B.news
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