Laíse mora na Federação, em Salvador. Bruna reside em Buraquinho, Lauro de Freitas, região metropolitana. Ambas são universitárias, jovens, bonitas e, como tantas outras, exibem a boa forma em seus perfis nas redes sociais. E o que elas ainda têm em comum? Indignação. Ambas tiveram suas fotos roubadas por hackers, que criaram perfis falsos numa suposta plataforma de conteúdo erótico. E elas não foram as únicas. O CORREIO tomou conhecimento de que pelo menos 20 mulheres com as mesmas características foram vítimas desse tipo de ação criminosa somente no início deste ano.
Todos os perfis invadidos estavam abertos (sem restrição de acesso) na rede social Instagram. As fotos foram expostas em falsas contas com links que levariam à plataforma Top4Fans, empresa que atua em vários países no ramo de venda de conteúdo erótico por assinatura, permitindo que os criadores de conteúdo recebam mensalmente valores direto de seus fãs, além de gorjetas e um recurso pay-per-view. Figuras públicas já aderiram à indústria de entretenimento adulto, como modelos, atores, cantores e outras personalidades.
Diferentemente, a estudante de Administração Bruna Aragão Neves Guimarães, 22 anos, foi uma de muitas mulheres que tiveram páginas fakes criadas pelos hackers, que utilizaram uma tática para atrair outros seguidores das vítimas. Além das imagens de Bruna, os criminosos usaram um endereço semelhante ao da conta dela no Instagram. “Eles têm uma tática muito boa. Eles pegaram o endereço da conta da pessoa muito similar. No meu mesmo, ele acrescentou dois caracteres no final. Sempre é bem parecido, muda uma letra ou duas e embaixo o link da plataforma”, contou ela.
Hackers invadiram o perfil de Bruna no Instagram e fotos foram parar em suposta plataforma de conteúdo erótico (foto: divulgação) |
Bruna descobriu a fraude no dia 4 deste mês, através de uma amiga. “Eu fiquei sem entender o que estava acontecendo, porque era a minha foto ligada à mentira. O fato de você não privar sua conta não dá o direito de pessoas pegarem a sua foto e divulgar em outros perfis. Além de pegar as minhas fotos, eles ainda seguiram as pessoas que tenho na minha rede social. Todo mundo viu aquele perfil sem saber o que de fato estava se passando e hoje somos julgados o tempo todo pela sociedade”, disse ela, que, incialmente, ficou preocupada com o julgamento das pessoas.
A estudante de Administração tentou acessar a página falsa com o próprio perfil, mas sem sucesso. “Eles me bloquearam para eu não denunciar à rede social, mas entrei por um outro perfil e vi lá. Na mesma hora, pedi para as pessoas denunciarem e a conta caiu no mesmo dia”, contou. Antes de ter sido vítima, Bruna já tinha conhecimento da atuação dos hackers. “Há 15 dias já tinha visto umas dez pessoas que eu conheço que tinham passado pelo o que eu passei, pendido para que os seguidores fizessem a denúncia no Instagram”, relatou ela, que ainda não registrou um boletim ocorrência.
Bruna disse que outras 10 mulheres tiveram as fotos também roubadas por hackers (Foto: Divulgação) |
Academia
Já aluna de Direito, Laíse Araújo Silva, 28, descobriu que as fotos do Instagram foram roubadas quando estava na academia, no dia 7 deste mês. “Quando terminei o treino, meu amigo me perguntou: ‘Você está fazendo algum trabalho no Instagram? Pois tem aqui sua foto indicando conteúdo erótico’". Aí, quando fui olhar no meu direct, notei que várias pessoas me perguntavam se eu realmente estava fazendo aquilo, divulgando as fotos. Eu fiquei sem reação e muito assustada”, contou Laíse.
Ela contou que chegou a sofrer assédios, mesmo explicando não saber o porquê de suas imagens terem ido parar no perfil que daria acesso à plataforma Top4Fans. “Um homem que não conheço enviou várias mensagens, insistindo que queria ter a certeza de que as fotos que iria ver eram as minhas. Um outro, que não tenho muita intimidade, disse pra mim que assinaria se realmente fosse eu”, relatou.
Laíse sofreu assédio após fotos serem divulgadas em perfil falso (Foto: Divulgação) |
Após divulgar que era vítima de uma fraude, Laíse descobriu que outras mulheres passaram pelo mesmo constrangimento. “Por base, umas dez pessoas relataram a mesma situação nas minhas postagens”, relatou a estudante, que optou por denunciar o caso à polícia, embora as demais não fizeram o mesmo.
Polícia
Laíse registrou um boletim de ocorrência na Delegacia Virtual no dia 8 deste mês. A investigação está a cargo da 7ª Delegacia (Rio Vermelho) e o inquérito foi instaurado como crime de estelionato. Sobre o caso de Laíse, a Polícia Civil informou que “a investigação sobre a ocorrência citada ainda está em caráter preliminar, visto que o registro foi na quarta”.
A PC informou à reportagem que não dispõe de dados sobre vítimas (mulheres) que tiveram fotos expostas sem autorização em sites e perfis de conteúdo erótico. Foi solicitada uma fonte para ampliar a discussão do assunto, principalmente no que diz respeito à investigação, mas a PC não respondeu.
Laíse registrou boletim de ocorrência, mas polícia ainda não tem pista de bandidos (Foto: Divulgação) |
Golpes
No entanto, a estudante de administração Bruna acredita que os criminosos são da região de Lauro de Freitas. “Eu acho que é alguém aqui da região, porque a maioria dos casos que aconteceu foi daqui da região de Villas do Atlântico e Buraquinho”, disse.
Para o especialista em cyber segurança, Bruno Bittar, as páginas fakes podem ter um outro objetivo: golpes. “Muitas vezes é uma conta montada, onde o único objetivo é atrair o maior número de assinantes, oferendo como isca as fotos das meninas, para esses criminosos terem acesso aos dados pessoais de terceiros, como o cartão de crédito”, declarou Bittar.
Ele comentou o trabalho de investigação da polícia. “A delegacia que atua com crimes virtuais é muito limita, depende de um servidor, de uma operadora para saber a localização de um aparelho celular. É uma situação de catar migalhas, para saber onde o bandido passou. Quando junta tudo, o criminoso está em outro lugar. É preciso velocidade, um canal independente, onde os servidores e os canais de comunicação possam de fato proteger o cidadão”, criticou.
Prisão
De acordo com o especialista em direito digital, o advogado Mateus Nogueira, as consequências são diversas para as vítimas que têm suas imagens veiculadas nas redes sociais sem autorização. “Há casos de pessoas que já perderam o emprego , além de consequências psicológicas, como depressão. Tem gente que já tirou a própria vida”, declarou.
O artigo 218 C do Código Penal prevê pena para quem
divulga imagem ou vídeo sem autorização da pessoa exposta. “Prevê pena
de reclusão de um a cinco anos para esse tipo de prática e um aumento de
pena, caso quem divulgue essas imagens tenha ou tenha tido algum tipo
de relação próxima com as vítimas”, disse Nogueira.
Além de prisão,
os criminosos podem ter que pagar indenização por dados morais às
vítimas. “As mulheres que se sentirem prejudicadas, ou até mesmo as que
não se sintam prejudicadas, elas podem buscar a reparação civil,
constituindo um advogado, para entrar com uma ação por indenização por
dados morais e, eventualmente, por danos materiais, e quem divulgou as
imagens poderá ser condenado a fazer essa reparação”, explicou.
Plataformas
O CORREIO entrou em contato com a plataforma Top4fans através de mensagem em sua página na internet, mas até o momento não obteve resposta. Já a rede social Instagram declarou que: “Não permitimos nudez ou atividade sexual, nem contas que fingem ser outra pessoa no Instagram. Caso acredite que algum conteúdo viola as diretrizes da comunidade, denuncie”.
O Instagram informou que o usuário pode denunciar uma publicação por qualquer um dos seguintes motivos:
- Spam
- Nudez ou atividade sexual
- Símbolos ou discurso de ódio
- Violência ou organizações perigosas
- Bullying ou assédio
- Venda de mercadorias regulamentadas ou ilegais
- Violações de propriedade intelectual
- Automutilação ou suicídio
- Distúrbios alimentares
- Golpes ou fraude
- Informação falsa
- A rede social diz ainda que é possível denunciar perfil por publicar com conteúdo indevido, fingir ser outra pessoa ou ser alguém com menos de 13 anos.
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