O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes pediu vista (mais tempo para análise) do julgamento sobre a decisão provisória do ministro Roberto Barroso que restabeleceu o piso salarial da enfermagem. O pedido foi feito nesta 4ª feira (24.mai.2023), no plenário virtual da Suprema Corte.
O STF julgaria nesta semana a decisão de Barroso, relator do caso, concedida em 15 de maio. Os magistrados tinham até 23h59 de 6ª feira (26.mai.2023) para depositar seus votos. Na sessão virtual, os votos são publicados ao longo de uma semana, sem discussão das questões. No entanto, agora, Gilmar Mendes tem até 90 dias para devolver o processo.
Enquanto o julgamento está suspenso, a decisão provisória de Barroso continua válida. O ministro determinou que o piso nacional seja implantado após a aprovação do decreto que garantiu R$ 7,3 bilhões do Orçamento 2023 da União para custear o aumento dos salários nas instituições públicas e entidades privadas que atendam no mínimo 60% de seus pacientes pelo SUS (Sistema Único de Saúde).
Em sua decisão, no entanto, Barroso reconheceu que os recursos não são suficientes para garantir 100% do custeio da regra. Por essa razão, determinou a implementação da seguinte forma:
- funcionários públicos federais – o piso deve ser aplicado de maneira integral com reajustes dos salários de acordo com o estabelecido pela lei 14.434/2022;
- funcionários públicos de Estados, Distrito Federal e Brasília e de autarquias dessas instâncias e de entidades privadas que atendam, no mínimo, 60% de seus pacientes pelo SUS – nesse caso, o piso salarial só será aplicado até quando os recursos fornecidos pela União, de R$ 7,3 bilhões, atendam aos pagamentos.
- funcionários da iniciativa privada contratados por meio da CLT – o piso salarial da enfermagem deve ser aplicado como definido pela lei 14.434/2022, exceto se houver convenção coletiva que estabeleça outros valores levando em conta “a preocupação com demissões em massa ou comprometimento dos serviços de saúde”.
Além do voto do ministro Roberto Barroso (eis a íntegra – 116 KB), apenas o ministro Edson Fachin votou. O magistrado divergiu da decisão do relator e mandou pagar integralmente o novo piso nacional da enfermagem. O voto de Fachin (leia a íntegra – 111 KB) fala em “justiça social” e “dignidade da pessoa humana”, mas não informa como as entidades públicas e privadas terão recursos para pagar os novos salários.
Fachin divergiu dos pontos 2 e 3 de Barroso. O ministro defendeu em seu voto a integral aplicação do novo piso nacional da enfermagem, mas sem dizer de onde devem sair os recursos.
Com a manutenção da decisão enquanto o caso não termina de ser julgado, o setor privado terá de arcar sem auxílio com o aumento total das despesas com salários e encargos. O resultado deve ser o fechamento de unidades e demissão de profissionais com fechamento de postos de trabalho. Cálculos preliminares falam em demissão de até 165 mil profissionais.
Cidades das regiões Norte e Nordeste –que tradicionalmente já contam com estruturas mais precárias e dificuldades financeiras– serão desproporcionalmente impactadas pela regra. Isso se deve principalmente ao fato de a diferença entre a média salarial atual e os valores do novo piso nacional serem maiores do que nas regiões mais ricas do país.
HISTÓRICO DO PISO NACIONAL DA ENFERMAGEM
Eis o histórico da tramitação do piso salarial da enfermagem nos Três Poderes:
- aprovação no Congresso Nacional – em 14 de julho de 2022, o Congresso promulgou a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que torna o piso salarial para enfermeiros constitucional (Emenda Constitucional 124, de 2022). O texto determina piso salarial de R$ 4.750 para enfermeiros, R$ 3.325 para técnicos em enfermagem e R$ 2.375 para os auxiliares de enfermagem e parteiras;
- tema chega ao STF – ainda em agosto, a CNSaúde protocolou uma ADI na Suprema Corte questionando dispositivos da lei e alegando que haveriam prejuízos ao setor privado. O caso foi distribuído, por sorteio, ao ministro Roberto Barroso;
- suspensão do piso – em 4 de setembro de 2022, Barroso determinou a suspensão do piso salarial e pediu que o governo federal, Estados, Distrito Federal e entidades do setor prestassem informações acerca do impacto financeiro da lei. A decisão foi referendada pela Corte por 7 votos em 16 de setembro;
- nova emenda constitucional – em 23 de dezembro de 2022, o Congresso Nacional publicou uma nova emenda à Constituição que estipula que a União ajudará os Estados e Municípios a pagarem o novo piso;
- PLN do piso da enfermagem – em 26 de abril deste ano, o Congresso aprovou o Projeto de Lei do Congresso Nacional enviado pelo Planalto sobre o tema. O projeto liberou R$ 7,3 bi dos cofres públicos para o Ministério da Saúde e permite que Estados, municípios e entidades privadas com ou sem fins lucrativos que atendam pelo menos 60% de seus pacientes pelo SUS recebam recursos para bancar o aumento nas despesas com salários;
- verba é sancionada – o presidente Lula sancionou, em 12 de maio, a medida aprovada pelo Legislativo, de iniciativa do Palácio do Planalto;
- piso é restabelecido – em 15 de maio, Barroso restabeleceu o piso salarial por meio de uma decisão liminar (provisória).
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