'Ação criminosa', reforça sobrevivente de ação que resultou na morte de subtenente


"Uma ação policial criminosa." Assim se referiu o sargento da reserva Adeilton Rodrigues D'Almeida, 54 anos, à invasão da Pousada Itajuípe que terminou na morte do subtenente Alberto Alves dos Santos, 51 anos, no ano passado, no sul do estado. "Foi ceifada a vida de uma pessoa honrada e atentaram contra a minha vida. Mesmo eu tendo sido alvejado, em momento nenhum, os policiais recuaram e prestaram o devido socorro", falou D'Almeida em seu depoimento nessa terça-feira (18), durante o primeiro dia de julgamento dos 13 policiais militares envolvidos na ação.

Cinco deles - identificados apenas como Josicley, Igor, Saimon, Marcos Vinícius e Jamily - são réus por terem matado o subtenente Alves. Josicley e Igor são apontados como responsáveis pelos tiros dados contra a vítima, enquanto Saimon, Marcos Vinícius e Jamily deram apoio tático, segundo denúncia do Ministério Público.

Assim como o subtenente Alves, o sargento D'Almeida era integrante da equipe de segurança de ACM Neto durante a campanha eleitoral de 2022. O sargento foi atingido por cinco disparos, mas conseguiu sobreviver. "Os policiais sabem que a invasão a domicílio só deve ocorrer em alguns momentos específicos. No caso da gente, era um ambiente considerado uma casa, que foi invadido após as 23h", acrescentou ele. "Eles invadiram de forma abrupta, arrombaram a porta e já foram efetuando disparos de armas de fogo, sem ter me dado chance de me identificar como policial militar", continuou D’Almeida.

Além dele, foram ouvidas outras duas testemunhas que estavam na pousada — o capitão Deivide Costa e o soldado Akeo Ribeiro; o tenente Fábio, da Companhia Independente de Policiamento Especializado (Cipe) Cacaueira — que foi o responsável por ter recebido as primeiras informações que levaram à operação em questão —; um policial rodoviário federal identificado como França; e dois funcionários do estabelecimento à época. Os acusados, porém, não estiveram na Vara do Bonfim e acompanharam o indiciamento e as falas das testemunhas por meio de videoconferência.

A reportagem teve acesso apenas a parte do depoimento de Akeo, que, por medo de represálias, preferiu não dar entrevista. Questionado pela promotoria do Ministério Público (MP) da Bahia, autor da denúncia, o soldado afirmou que, ao ter saído do quarto onde estava, Alves já tinha sido morto e D'Almeida, baleado. Para Akeo, os autores da ação sabiam somente que ele era policial e não o abordaram para evitar um possível confronto.

"A foto que estava no aplicativo deles era a minha. Não sei como eles buscaram meu nome nem nada disso. Eu era o único policial identificado", contou ele, que tinha sido responsável por fazer, em seu nome, também as reservas dos três colegas na pousada. Ainda segundo o soldado, mesmo com a constatação da morte de Alves, os acusados optaram por prestar atendimento a D'Almeida em segundo lugar e o levaram ao hospital numa viatura, quando o sargento foi hostilizado. "Ele falou pra mim que, no trajeto, um policial falou: 'Essa porta aqui pode abrir', dando a entender que poderia empurrá-lo", detalhou.

A promotoria do MP prevê que o julgamento dure, ao menos, mais quatro dias, devido à quantidade de testemunhas (até sete por réu) e de réus (13) que vão ser sabatinados perante o juiz. A marcação da próxima audiência vai depender do tempo que a Vara vai precisar para a intimação das testemunhas e, portanto, pode se arrastar por até um mês.

Ruído de informação entre PRF e PM

O agente França explicou que um ruído de comunicação entre a PRF e os PMs teria direcionado os acusados para a Pousada Itajuípe. No dia 27 de setembro de 2022, a Secretaria de Segurança Pública (SSP-BA) informou que os PMs buscavam o criminoso André Márcio Jesus. Conhecido como Buiú, ele havia deixado o Complexo Penitenciário de Lauro de Freitas no mesmo dia, às 13h30, enquanto estava com benefício de saída temporária, usando tornozeleira eletrônica. Por volta das 14h30, Buiú rompeu a tornozeleira, quando estava na BR-324, perto de Candeias.

Nesse horário, os veículos do subtenente Alves e do sargento D'Almeida - outra vítima do caso - passaram pelo local onde o criminoso se livrou da tornozoleira, o que colocou os veículos como possíveis meios de fuga. "O fato do Duster e do Renegade terem passado pelo local onde ele rompeu a tornozeleira no mesmo horário foi um critério para que se considerasse a possibilidade dele estar em um desses veículos", disse França.

Em depoimento, o agente afirmou ter recebido a indicação dos veículos como suspeitos pelo setor de inteligência da PRF já durante a noite daquele dia. A partir dessa informação e da suspeita de que Buiú estava a caminho de Porto Seguro, os policiais militares foram comunicados da possibilidade de o criminoso estar com comparsas na região, circulando nos carros indicados pelo setor de inteligência.

O agente, porém, ressaltou que as informações cedidas pela PRF eram "possibilidades a serem apuradas" e não afirmações concretas da ligação entre os veículos e Buiú. Já a defesa dos policiais usou prints da comunicação entre as duas forças de polícia para sustentar que as indicações foram transmitidas como afirmações e, por isso, a ação foi conduzida daquela maneira.

Denúncia do MP

O primeiro dia de audiência serviu também para a leitura na íntegra da acusação feita pelo MP contra os policiais. Nela, a promotoria afirmou que os acusados se dividiram em três células táticas na pousada para ir até os quartos do subtenente Alves, do sargento D'Almeida e do Capitão David, outro PM que estava na pousada no dia da apuração.

Quatro dos policiais foram indiciados por invadir o quarto de David à força, rendê-lo de maneira agressiva e tê-lo constrangido no chão. Outros cinco, identificados apenas como Josicley, Igor, Saimon, Marcos Vinícius e Jamily, são réus por terem matado o subtenente Alves. Entre eles, Josicley e Igor são apontados como responsáveis pelos tiros dados contra a vítima, enquanto Saimon, Marcos Vinícius e Jamily deram apoio tático.

O laudo médico anexado à denúncia indicou que Alves foi atingido por tiros a distância e também a curta distância quando estava em posição de defesa e não de ataque, o que sugere uma execução da vítima quando ela estava no chão. Em perícia, foi constatado que os disparos de arma de fogo aconteceram apenas de fora para dentro do apartamento, o que refuta a possibilidade de reação de Alves.

Os policiais identificados como Everton, Dilton Mário, José Benevuto e Leonardo foram apontados como responsáveis por arrombar e invadir o quarto onde estava o sargento D'Almeida, que foi atingido por cinco tiros na ação, mas sobreviveu.

Segundo o MP, os responsáveis pelos tiros foram Everton e Dilton Mário, que também atingiram colegas do grupo tático anterior [Jamily e Saimon]. O grupo é réu por tentativa de homicídio, já que além de ferir o sargento D'Almeida, demorou 32 minutos e 40 segundos para oferecer socorro e encaminhá-lo a um hospital.

Relembre o caso

O subtenente Alberto Alves dos Santos, de 51 anos, fazia parte da equipe de segurança do candidato ACM Neto (União Brasil) e estava em Itajuípe para um evento de campanha que aconteceria no dia seguinte, em Coaraci.

A SSP informou que a situação se originou com a busca por um assaltante de banco. Identificado como André Marcio Jesus, conhecido como Buiú, ele tem ligação com uma facção criminosa paulista e deixou o Complexo Penitenciário de Lauro de Freitas no dia 27 de setembro de 2022, às 13h30, com benefício de saída temporária, usando tornozeleira eletrônica.

Por volta das 14h30, Buiú rompeu a tornozeleira, quando estava na BR-324, perto de Candeias. A PM deu início às buscas e, quando as equipes estavam em Uruçuca, também no sul do estado, um assaltante de banco identificado como Bismark e um comparsa foram abordados e trocaram tiros com os militares. Os dois foram mortos. Buiú segue como foragido.

Correio 24 horas

Postar um comentário

0 Comentários