STJ mantém falência da Coesa, ex-OAS, e ministro vê ‘contradição’ na cessão de contratos


O Superior Tribunal de Justiça (STJ) publicou nesta terça-feira, 18, a decisão que negou o pedido de liminar da Coesa, antiga construtora OAS, para reverter a falência da empresa. O ministro que analisou o caso, o vice-presidente do STJ, Og Fernandes, disse haver uma “aparente contradição” na cessão de contratos da Coesa, antiga construtora OAS, para a KPE Engenharia, outra empresa do mesmo grupo econômico. Os contratos gerariam caixa de R$ 30 milhões a R$ 40 milhões para a Coesa, mas foram cedidos à KPE antes do pedido de recuperação judicial de forma gratuita. A decisão foi tomada na última sexta-feira, 14, e disponibilizada hoje.

As empresas do grupo pertencente à antiga OAS estão em um imbróglio jurídico no qual a empreiteira se envolveu ao fazer uma reestruturação societária há três anos. No centro do escândalo de corrupção revelado pela operação Lava Jato, a OAS mergulhou em uma crise de imagem e econômica que a levou ao processo de recuperação judicial concluído em 2020, com a divisão da companhia em duas: a Metha e a Coesa. Na Justiça, no entanto, credores argumentam que o rearranjo foi uma fraude com o intuito de lesar aqueles que têm valores a receber.

A Coesa entrou em recuperação logo após o fim do processo da OAS, em 2021, e tem uma dívida de cerca de R$ 4,5 bilhões. No final de junho, ao analisar um pedido da Gerdau, o Tribunal de Justiça de São Paulo converteu falência o processo de recuperação judicial da construtora Coesa. A Gerdau argumentava que a correlação entre as empresas é óbvia e que a separação foi meramente formal e argumentou que as mudanças na estrutura societária “tiveram como único e precípuo objetivo ludibriar os credores e proteger patrimônio em detrimento do pagamento de vultosas dívidas”. Os que se sentem prejudicados com a cisão afirmam que a Metha ficou com a parte saudável da operação, enquanto a Coesa ficou com as dívidas. A KPE Engenharia é também uma empresa do mesmo grupo econômico.

A Coesa foi ao STJ tentar reverter a falência decretada pelo TJ-SP no dia 27 de junho, mas teve o pedido de liminar (decisão provisória no caso) rejeitado. A empresa já havia tentado uma liminar no próprio TJ-SP, que foi negada. Ainda é possível um último recurso no Supremo Tribunal Federal (STF), mas fontes ligadas ao processo acreditam ser difícil reverter a situação.

Segundo o ministro vice-presidente do STJ, ministro Og Fernandes, há uma “contradição entre a conduta das requerentes – no ponto em que declinaram de obras, contratos e créditos – e as razões lançadas sobre a necessidade de manutenção do plano de recuperação judicial para soerguimento da sociedade empresária”.

Para o ministro, não há porquê a Coesa falar em consequências trabalhistas, sociais e econômicas, se ela abriu mão “de forma graciosa, de importantes obras em andamento e créditos para outra empresa do grupo”, afirmou o ministro Og Fernandes, no exercício da presidência, na decisão tomada na última sexta-feira, 14, e disponibilizada hoje.

O ministro também disse que não há o que mudar na decisão do TJ-SP. “Não há como afastar, em princípio, na via estreita do recurso especial, as conclusões do acórdão proferido pela Corte de origem, tomadas com base na análise do acervo fático-probatório dos autos, quanto à existência de esvaziamento patrimonial e fraude contra credores”, afirmou o ministro.

Ao STJ, a Coesa disse que foi surpreendida pelo decreto de falência do TJ-SP e que nenhum dos credores pediu a falência da empresa por fraude. Dos 15 credores que entraram com recurso contra o plano de recuperação judicial homologado pela Justiça, apenas um, a Rigabras, uma transportadora do Rio Grande do Sul com créditos da ordem de R$ 400 mil, pediu a falência da Coesa devido à ilegalidade do plano aprovado.

Defesa

O escritório do advogado Eduardo Munhoz foi procurado e disse estudar os próximos passos a serem tomados, mas não confirmou se vai entrar com um recurso. Outros advogados ligados à Coesa também foram procurados, mas não quiseram comentar. O diretor-presidente da Coesa, José de Maria Magalhães de Azevedo foi contatado, mas não enviou resposta. A KPE não quis comentar.

Sucessão de crises

Em 2013, auge de uma época de grandes obras públicas e antes das revelações trazidas à luz pelo esquema de corrupção revelado pela operação Lava Jato, a empreiteira chegou a ter 120 mil funcionários. Durante o processo de recuperação judicial, o número caiu para pouco mais de 30 mil. A OAS fazia parte do que ficou conhecido como “clube vip” de empreiteiras – as empresas que se associavam para fraudar licitações e superfaturar contratos. Faziam parte do mesmo grupo a Odebrecht, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e UTC.

Em 2019, a OAS assinou um acordo de leniência com o poder público, no qual a empresa confessou o envolvimento em corrupção. Na época, foi o terceiro maior acordo, em valores, assinado no âmbito da Lava Jato, com compromisso de pagamento de R$ 1,92 bilhão.

Antes disso, a OAS já havia sido arrastada para o epicentro do escândalo e seus desdobramentos políticos. Preso em 2016, o ex-presidente da empreiteira, Léo Pinheiro, assinou um acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República.

Léo Pinheiro foi o principal acusador do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na investigação ligada ao triplex no Guarujá (SP), que levou o então ex-presidente a ser preso. O Supremo Tribunal Federal anulou a condenação de Lula e considerou suspeita a atuação do ex-juiz Sergio Moro no caso. A ação foi, então, enviada para a Justiça Federal do Distrito Federal e, posteriormente, arquivada.

O fim da época de grandes obras, somado à deterioração do cenário econômico no País e à pandemia, agravou o cenário já complexo para as empreiteiras que deviam multas bilionárias à União pelos atos de corrupção confessados.

Marcela Villar/Estadão

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