Pelo menos 77 pessoas morreram em confrontos policiais no mês de setembro na Bahia, 92% a mais do que o registrado no mesmo período do ano passado (40). De acordo com o Instituto Fogo Cruzado, que monitora ações violentas em Salvador e outros 13 municípios da Região Metropolitana (RMS), foram contabilizadas 68 mortes até a última quinta-feira (28). O levantamento não inclui, por tanto, outras nove mortes: cinco ocorridas em Acajutiba na terça-feira (26), uma em Salinas da Margarida e três em Salvador - as últimas quatro registradas nesta sexta-feira (29).
Na capital baiana, dois suspeitos foram mortos por policiais militares após confronto no bairro de Nova Brasília, durante a Operação Alvorada, deflagrada na madrugada desta sexta. Segundo a Polícia Militar (PM-Ba) foram apreendidos um revólver calibre 38, com quatro munições usadas e uma intacta, uma pistola 9mm e uma mochila com porções de cocaína, maconha e uma balança de precisão.
A terceira morte registrada em Salvador nesta sexta ocorreu no bairro de Valéria, mesma localidade onde cinco pessoas morreram há 15 dias, entre eles o policial federal Lucas Caribé, que ganhou repercussão nacional. Policiais militares, civis e federais da Força Integrada de Combate ao Crime Organizado (FICCO) realizaram uma operação no bairro que terminou com um homem morto após confronto, um preso e apreensões de drogas, armas e celulares.
Já a vítima de Salinas das Margaridas chegou a ser socorrida para uma unidade de saúde após trocar tiros com policiais do 23° Batalhão de Polícia Militar (BPM), mas ele não resistiu aos ferimentos e morreu no hospital, segundo informações da guarnição. Os PMs faziam uma ronda quando se depararam com o suspeito armado.
A PM afirma que os cinco mortos em Acajutiba eram suspeitos de envolvimento com o tráfico de drogas e foram interceptados durante a operação Operação Paz, que apreendeu seis armas de fogo, maconha, cocaína e crack na localidade conhecida como Estrada do Cumbe.
Conforme aponta o Fogo Cruzado, as mortes são resultado de 71 tiroteios em ações policiais registrados em setembro (até o dia 28), que deixaram, além de pelo menos 77 mortos, 13 pessoas feridas. Entre as vítimas fatais, 31 foram alvejadas nas cinco chacinas policiais que ocorreram no período. Somados aos confrontos que resultaram nas mortes não contabilizadas pela instituição, o número de tiroteios avança para pelo menos 80.
Maior número de baleados em 15 meses
A letalidade policial corresponde a metade das mortes por arma de fogo em setembro (137), fazendo deste mês o maior em número de pessoas baleadas durante ações policiais em comparação com os últimos 15 meses - período em que o Fogo Cruzado mapeia dados deste tipo na Bahia.
O número supera inclusive os registrados no Rio de Janeiro, historicamente marcado pela letalidade de suas ações policiais. Em setembro, os cariocas enfrentaram 33 tiroteios em ações policiais, a morte de 13 pessoas - 6 na única chacina contabilizada no período - e 21 feridas.
O estado baiano também amargou a posição à frente do Rio de Janeiro em letalidade policial no mês de agosto. Enquanto a Bahia acumulou 64 tiroteios em ações policiais que resultaram em 61 pessoas mortas e oito feridas, além de quatro chacinas. O Rio de Janeiro registrou 37 tiroteios em ações policiais, 22 pessoas mortas e 28 feridas. Houve uma única chacina envolvendo policiais com 10 mortos.
Escalada de violência
Na escalada de violência, a capital baiana, principal cidade do estado, tem figurado na imprensa como o epicentro, com o fortalecimento de facções criminosas. Segundo o especialista em segurança pública Thiago Costa, há um movimento de migração desses grupos para Salvador, em busca de um dos mercados de drogas mais lucrativos do estado, ao lado de Feira de Santana e Porto Seguro.
Cidades baianas que também possuem uma rota estratégica para a exportação do produto ilícito. “Mesmo com [a realização de] apreensões de armas e drogas, o movimento ainda é muito pouco com relação ao que chega nas cidades”, afirma Thiago.
Outro aspecto que justifica o cenário de violência, segundo o especialista em segurança pública, é a ação truculenta da Polícia Militar da Bahia (PM-Ba), que prioriza o combate ao invés das ações de inteligência, figurando como a mais brutal do país, à frente do Rio de Janeiro.
“Só atacam as pontas do tráfico e no outro dia a facção já recupera tudo. Pessoas, inclusive, são descartáveis para eles, porque há uma massa de gente em vulnerabilidade nas cidades - a Bahia também tem o recorde de desemprego do país e 70% de Salvador não tem nenhum planejamento urbano. Tudo se interliga e o tráfico obtém dinheiro de diversas formas: roubo, furto, carros, celulares e assaltos a banco. Até grandes festas promovidas por líderes e o mercado imobiliário paralelo podem ser fontes para lavagem de dinheiro das facções”’, explica Thiago.
Em 2023 (até o dia 28 de setembro), o Instituto Fogo Cruzado mapeou 488 tiroteios na Bahia durante ações policiais que resultaram em 398 mortos e 79 feridos. O número de mortos é 17% maior do que o registrado no Rio de Janeiro (340). Também houve 27 chacinas decorrentes de operações policiais na Bahia, com 114 pessoas mortas. No mesmo período, foram registradas 22 chacinas policiais no Rio de Janeiro, com 92 mortos.
A reportagem entrou em contato com a Secretaria de Segurança Pública da Bahia pedindo um posicionamento sobre a escalada de violência no estado e o perguntando quais medidas estão sendo adotadas para reverter o cenário e aguarda retorno.
Correio
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