Agiotas do PCC corrompiam policiais e sequestravam bens de devedores

Imagem colorida de homem fumando charuto na frente de um hotel - Metrópoles 

Investigação do Ministério Público de São Paulo (MPSP) revelou uma rede de agiotas, ligada ao Primeiro Comando da Capital (PCC), que movimentou R$ 20 milhões só no ano passado. Segundo a promotoria, o esquema também envolvia corrupção de policiais e até sequestro de bens de devedores.

Os agiotas do PCC cobravam juros abusivos, de 10% a 300% ao mês, de quem decidia pegar dinheiro emprestado, de acordo com o MPSP. Em caso de inadimplência, era imposta multa de R$ 1 mil por dia. Se o pagamento atrasasse, o devedor sofria ameaças e tinha seus bens tomados à força.

O Metrópoles teve acesso a detalhes da investigação que tramita em segredo de Justiça e motivou a Operação Khalifa, deflagrada na terça-feira (7/5), para cumprir 11 mandados de prisão na capital paulista e na região do Alto Tietê. Ao todo, 9 pessoas foram detidas e duas estão foragidas.

Na liderança do grupo, estava Edson Carlos do Nascimento (foto de destaque), o Kaká, apontado como “membro relevante” do PCC, que é ligado a outras investigações sobre jogo de azar e posse ilegal de arma de fogo.

 Reprodução de organograma composto por fotos 3x4 e nomes - Metrópoles

Agiotas

No “núcleo de agiotagem”, o braço direito de Kaká era Daniel Carvalho Vasconcelos Santana. Segundo o MPSP, ele era responsável por administrar os empréstimos e fazer a contabilidade dos valores arrecadados pelo bando.

Caberia ao acusado passar as “diretrizes” para os “funcionários” do bando, que faziam o contato direto com os “clientes” – ou seja, arrecadar os pagamentos e cobrar as dívidas.

Segundo a promotoria, esse trabalho era exercido por Fernando de Souza Santos, o Gordo, Ricardo dos Santos Barbosa, o Chocolate, e Rodrigo de Carvalho Covelo. Outro homem e uma mulher também são investigados pelo esquema, mas não tiveram pedido de prisão temporária.

O MPSP afirma que a prática da agiotagem em larga escala apareceu como alternativa para assaltos e tráfico de cocaína, a principal atividade do PCC. O esquema teria ganhado espaço na facção criminosa por ser lucrativo e “muito menos perigoso sob o ponto de vista de repressão policial”.

Ligação com PCC

Outro alvo da investigação é o advogado Marco Antônio Pereira de Souza Bendo, o Paçoca, que é acusado de ser membro do PCC. De acordo com a promotoria, a casa teria sediado um suposto Tribunal do Crime em setembro de 2023.

O caso foi flagrado em um grampo do MPSP. “Nós está numas ideias aqui com o vagabundo. É o seguinte: ele vai morrer [sic]”, diz uma das mensagens, atribuída a Kaká na investigação.

Também são apontados como integrantes da facção Jonathan Lemos da Cruz, o Jhow, Eduardo Nunes da Silva, o Eduardinho, e Sedemir Pelicari Fagundes, o Alemão, que foi preso enquanto levava ajuda para vítimas da tragédia no Rio Grande do Sul.

Completam o “núcleo do PCC” os alvos Luiz Carlos Rodrigues Garcia e Márcio Pereira dos Santos.

Sequestro de bens

Consta na investigação um caso, registrado em março de 2023, em que dois dos investigados invadiram o apartamento de um homem que havia recolhido empréstimo de R$ 24 mil e ainda devia R$ 10 mil.

“Estou armado com uma 380 e já tenho passagem”, um deles teria ameaçado. Segundo a promotoria, a dupla saiu do local levando a chave do veículo da vítima.

Seis meses depois, o grupo cobrou um dono de mercado. “Ele tem 500 conto aqui, e R$ 1.000 ele consegue na segunda-feira, mano. O cara tá enrolando, já vendeu o mercado aqui, não tem mais nada”, diz um cobrador. Ao que Daniel responde: “Manda ele se virar, ué”. A conversa termina com o aviso de que um caminhão estava a caminho do estabelecimento para “recolher as coisas”.

Na investigação, o MPSP também incluiu trocas de mensagens em que os alvos relatam o caso de um devedor que estava “tremendo de nervoso” ao ser cobrado e o de outra mulher que estaria resistindo ao pagamento. “Você não vai cancelar o CPF dela?”, questiona Daniel.

Corrupção de policiais

Além de ameaças e extorsões, a investigação aponta envolvimento do grupo com práticas para corromper policiais. Um desses episódios é narrado em uma conversa entre Kaká e um interlocutor, identificado apenas como Leo, após a prisão de um amigo em comum em Itaquaquecetuba, na Grande São Paulo, em outubro de 2023.

Na conversa, o interlocutor diz que precisa de R$ 20 mil para pagar propina aos policiais para soltar o sujeito que havia sido detido por porte ilegal de arma de fogo. “Kaká pergunta se tem gravata (advogado) lá”, registra o MPSP, na investigação. “Completa dizendo que não irá cobrar juros e pergunta se Léo pode devolver o valor na sexta-feira.”

A promotoria também cita que Paçoca está sendo processado, no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), por corrupção ativa. Segundo a acusação, ele ofereceu vantagem indevida a policiais para livrar “alguns indivíduos” que respondiam por tráfico de drogas.

O MPSP levanta a suspeita, ainda, de que informações sobre a Operação Khalifa, cuja investigação deveria ter corrido em completo sigilo, vazaram para os alvos antes da hora. De acordo com a promotoria, Kaká, Daniel e Eduardinho chegaram a se reunir em Arujá, no Alto Tietê, para discutir a situação no dia 23 de fevereiro de 2024.

“Nota-se também que, após tomarem conhecimento da existência da presente investigação, os investigados passaram a adotar providências com vista a dificultar a ação deste órgão de investigação e impedir a aplicação da lei penal, com o saque de elevadas quantias em dinheiro, a mudança de senhas de aparelhos celulares, e-mails, redes sociais e de seus escritórios, a alteração do objeto social de suas empresas, dentre outras ações”, diz a promotoria.

Metrópoles 

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