Com o avanço do Projeto de Lei (PL) nº 1.904/24, que equipara o aborto ao crime de homicídio, o governo federal precisou endurecer o tom publicamente contra o texto. No início da semana, as manifestações eram tímidas, a fim de não dar força ao tema. Mas até a sexta-feira (14/6), com a reações negativas à matéria, as declarações já eram diferentes.
O ministro Alexandre Padilha, das Relações Institucionais, havia sido questionado por jornalistas a respeito do PL na segunda-feira (10/6) e se limitou a dizer: “O governo vai entrar em campo para que a pauta da Câmara não seja de projetos que aticem a beligerância e violência política”.
Ao fim da semana, Padilha foi mais contundente. “Não contem com o governo para mudar a legislação de aborto no país, ainda mais para mudar para um projeto que estabelece que mulher estuprada vai ter uma pena duas vezes mais do que o estuprador. Não contem com o governo para essa barbaridade”, disse.
O ministro ainda disse que a negativa seria reforçada com os líderes no Congresso Nacional. “Vamos trabalhar para que esse projeto não seja votado”, reforçou.
A ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, também se manifestou, por meio de uma publicação no Instagram. A titular da pasta afirmou que o país vive “uma epidemia de abuso sexual infantil” e que o projeto pode impulsionar casos de estupro.
“Não podemos revitimizar mais uma vez meninas e mulheres vítimas de um dos crimes mais crueis contra as mulheres, que é o estupro, impondo ainda mais barreiras ao acesso ao aborto legal, como propõe o PL 1.904/2024. Criança não é para ser mãe, é para ter infância, é para ser criança, estar na escola”, ressaltou.
Outras reações
Além de Padilha e Cida, coube aos ministros ligados à área social se manifestarem. Primeiro, o titular dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, falou do assunto no X (antigo Twitter).
“Trata-se da materialização jurídica do ódio que parte da sociedade sente em relação às mulheres; é uma lei que promove o ódio contra mulheres. Como pai, como filho, como cidadão, como jurista, como Ministro de Estado eu não posso jamais me conformar com uma proposta nefasta, violenta e que agride as mulheres e beneficia estupradores”, disse na quarta-feira (12/6).
Anielle Franco, ministra da Igualdade Racial, comentou o tema na quinta-feira (13/6): “Esse projeto representa retrocesso e desprezo pela vida das mulheres. Esse não é o Brasil que queremos”.
Na sexta-feira, foi a vez da ministra Marina Silva, do Meio Ambiente. “Acho que é uma atitude altamente desrespeitosa e desumana com as mulheres achar que o estuprador deve ter pena menor do que a mulher estuprada e que não teve condição de ter acesso dentro do tempo para fazer uso da lei que lhe assegura o direito ao aborto legal”, afirmou.
Lula não se manifestou
Apesar disso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se esquivou de tomar uma posição pública sobre o PL do Aborto. Questionado na quinta-feira (13/6), em viagem à Suíça, ele respondeu: “Você acha que não é justo, eu acabei de sair da palestra, eu falar de algo da Câmara? Deixa eu voltar para o Brasil, você pergunta e eu te respondo”.
A primeira-dama do Brasil, Janja Lula da Silva, utilizou as redes sociais na sexta para questionar o projeto. “Os propositores do PL parecem desconhecer as batalhas que mulheres, meninas e suas famílias enfrentam para exercer seu direito ao aborto legal e seguro no Brasil”.
“Isso ataca a dignidade das mulheres e meninas, garantida pela Constituição Cidadã. É um absurdo e retrocede em nossos direitos”, completou.
O que diz o texto
O PL 1904/24 equipara ao crime de homicídio o aborto acima de 22 semanas de gestação. O texto vale, inclusive, para situações onde a interrupção da gravidez é permitida, como em casos de estupro de crianças e mulheres.
Na quarta (12/6), a Câmara dos Deputados aprovou, “às escuras”, o requerimento de urgência do texto. Caso a matéria seja aprovada, a mulher que realizar o procedimento pode ser condenada de 6 a 20 anos reclusão.
A pena é superior ao do crime de estupro, que prevê prisão de 6 a 10 anos.
Metrópoles
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