O Congresso Nacional vai reagir às ações da Procuradoria-Geral da República (PGR) e às decisões do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), que miraram nas emendas parlamentares e ameaça até retaliar o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na elaboração das regras do Orçamento para 2025.
Nesta quarta-feira, 7, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, entrou no STF pedindo a derrubada das chamadas emendas Pix, mecanismo de transferência de recursos sem transparência. Essas emendas permitem que congressistas enviem dinheiro público para Estados e municípios que podem ser gastos durante a campanha.
A ação causou insatisfação no Congresso e se somou às decisões do ministro Flávio Dino, que cobrou transparência e novos procedimentos para todos os tipos de emendas e levou o governo Lula a suspender a liberação de sobras do orçamento secreto. A Secretaria de Comunicação Social (Secom) da Presidência da República foi procurada, mas não comentou o pedido da PGR.
O presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO), deputado Julio Arcoverde (PP-PI), decidiu suspender a votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025, que estava programada para a segunda quinzena de agosto, em reação. A votação deve ficar para depois das eleições municipais. Além disso, parlamentares preparam mudanças no projeto da LDO para garantir o controle do Orçamento e evitar que as emendas sejam canceladas.
“Estou vendo mais uma vez a interferência do Poder Judiciário e do Ministério Público em relação ao Congresso. Não vou deixar ser lido o relatório da LDO depois de uma decisão dessa e os parlamentares já estão preparando emendas porque tem que ser encaminhada uma solução”, disse Arcoverde à reportagem.
O adiamento atinge o governo Lula, que terá de enviar a Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2025 até o dia 31 de agosto sem as regras aprovadas pelo Congresso e ainda sem previsão de quando as diretrizes vão ser votadas. Nos bastidores, parlamentares enxergam interesse do governo com as ações de Flávio Dino para recuperar nacos do Orçamento que o Congresso Nacional capturou nos últimos anos.
“Não se pode perder nenhum direito adquirido de nenhum parlamentar em relação às emendas. Transparência dá para discutir sempre, meio-termo não. Temos que discutir essa interferência”, disse o presidente da CMO.
O alívio nas decisões de Dino é que os recursos prioritários foram transferidos antes das eleições municipais e não serão afetados, além do fato de o ministro do STF não ter suspendido a execução orçamentária, como fez a ministra Rosa Weber com o orçamento secreto em 2021.
“O governo tem que ir para o diálogo com o Parlamento, não usar uma curva para que esse diálogo seja forçado ou não exista e dar a desculpa que é decisão do Judiciário. Um Poder não pode interferir no outro”, afirmou o relator-geral do Orçamento de 2025, senador Angelo Coronel (PSD).
Na próxima semana, os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), devem reunir os líderes das duas Casas para discutir a reação à ação da PGR contra as emendas Pix e às decisões de Flávio Dino. Líderes do Congresso se movimentam para evitar qualquer perda de influência no Orçamento, ainda que alguns procedimentos de transparência mudem. “Conquistas terminam virando cláusulas pétreas. Só se perde sob a lança nas costas ou sob tortura”, disse Angelo Coronel.
Congresso quer atrelar emenda Pix a obras específicas para evitar que recurso seja declarado inconstitucional
A emenda Pix se tornou o tipo de recurso mais enviado por parlamentares a Estados e municípios. O dinheiro é pago de forma mais rápida do que ocorria com outros tipos de emendas, mas não tem transparência e não é fiscalizado. Desde 2020, o mecanismo somou R$ 20,7 bilhões e bateu recorde neste ano, período de eleições municipais.
O ministro Flávio Dino cobrou transparência e determinou que o dinheiro só seja liberado depois de os municípios informarem o que vão fazer com o recurso, coisa que hoje não acontece.
Uma das propostas em discussão no Congresso é mudar a LDO para definir que as emendas Pix sejam indicadas para obras e projetos específicos, acabando com o “cheque em branco” que existe hoje. A sugestão foi feita pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) a aliados e começará a ser debatida. A estratégia é salvar a emenda Pix de ser considerada inconstitucional, como aconteceu com o orçamento secreto, e evitar que o dinheiro volte para o controle do governo.
“Vamos buscar uma solução que seja compatível com a prerrogativa do Congresso e, se há dúvida sobre a transparência e sobre as indicações, podemos clarear mais. Essas transferências é que têm sustentado os investimentos nos municípios”, afirmou o deputado Claudio Cajado (PP), aliado de Lira. “Para as emendas de comissão e de bancada, a tendência é elas crescerem ou passar para as individuais”.
Para o relator do Orçamento, é possível discutir a obrigação de vinculação das emendas Pix com projetos e obras específicos para não deixar o recurso livre “O parlamentar não é fiscal de obra. Se for acabar com a emenda Pix, tem que ver de que maneira os ministérios vão dar celeridade às emendas em outro formato”, afirmou.
Daniel Weterman/Estadão
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