A atuação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes preocupa os colegas da Corte. Magistrados dizem esperar que o inquérito aberto agora para investigar a troca de mensagens entre auxiliares de Moraes, com alvos direcionados, não prorrogue ainda mais o desfecho das investigações sobre a montagem de uma rede de fake news no governo de Jair Bolsonaro.
Aberto em março de 2019, o inquérito das fake news é visto na própria Corte como um “inquérito do fim do mundo”, que nunca termina, porque a cada hora é anexado a ele uma nova diligência.
Sob reserva, três ministros do STF disseram à reportagem que a preocupação de colegas de Moraes não é com a legalidade de suas ações. No diagnóstico de todos eles, porém, está mais do que na hora de Moraes pôr um ponto final nos inquéritos das fake news e das mílicias digitais porque ninguém pode viver sob “investigação permanente”.
A portas fechadas, colegas de Moraes argumentam, ainda, que essa situação joga cada vez mais a população contra o STF, além de provocar desconfianças no meio político e no setor econômico. Os mais próximos chegaram a dizer isso a ele. Em público, no entanto, todos defendem o ministro para demonstrar união da Corte.
Ao determinar à Polícia Federal, na quarta-feira, 21, a abertura de inquérito sobre a divulgação de mensagens de seus auxiliares no STF e no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Moraes associou a Polícia Civil de São Paulo à “possível origem criminosa do vazamento”.
O magistrado foi secretário da Segurança Pública de São Paulo no governo de Geraldo Alckmin, atualmente vice-presidente da República. Nos bastidores, ministros do STF costumam observar que até hoje Moraes “comanda uma tropa” na PM paulista.
Os diálogos mostrando que Moraes usou a Assessoria Especial de Enfrentamento (AEED) à Desinformação do TSE – chefiada à época por Eduardo Tagliagerro – como braço investigativo de seu gabinete no STF foram revelados pelo jornal Folha de S. Paulo.
As diligências envolviam Bolsonaro e seus aliados e, naquela ocasião, o TSE era presidido por Moraes, também ministro do STF. Por ter assento nos dois tribunais, ele afirmou que “seria esquizofrênico” mandar ofício para si mesmo
Tagliaferro depôs nesta quinta-feira, 22, na superintendência da PF em São Paulo. Ele foi exonerado após ter sido preso por suspeita de violência doméstica, em maio do ano passado, quando seu celular foi apreendido pela Polícia Civil.
O perito negou ter negociado o vazamento de dados do seu celular e disse que encontrou o aparelho “deslacrado e corrompido” quando o pegou de volta com policiais, seis dias depois. Por ordem de Moraes, a PF apreendeu o celular que estava com Tagliaferro no fim do seu depoimento.
Em despacho no qual determinou a abertura do novo inquérito, o ministro do STF também destacou que “notícias nas redes sociais” ligaram as mensagens de WhatsApp trocadas entre Tagliaferro e o juiz Airton Vieira – seu braço direito no STF – a um “possível vazamento de dados” no âmbito da Polícia.
A Polícia Federal mencionou a deputada Carla Zambelli (PL-SP), aliada de Bolsonaro, na portaria que abriu inquérito para apurar o vazamento de mensagens de auxiliares de Moraes.
A citação a Zambelli ocorreu porque a deputada fez uma publicação no X (antigo Twitter) em 9 de maio de 2023, dia seguinte à prisão de Tagliaferro. No texto, Zambelli dizia que “o assessor de um homem poderoso no Brasil está na delegacia, porque tentou matar a esposa, dando vários tiros dentro de casa ontem à noite”. O “homem poderoso” citado pela deputada era justamente Moraes.
Foi a partir daí que o ministro do STF viu ligação desse caso com o inquérito das fake news, do qual é relator. “Nego qualquer envolvimento com o vazamento de informações relacionadas ao gabinete do ministro Alexandre de Moraes”, escreveu Zambelli, em nota.
A deputada responde a vários inquéritos abertos com autorização de Moraes, entre os quais o que apura os ataques golpistas, em 8 de janeiro de 2023, para manter Bolsonaro no poder.
Vera Rosa/ Estadão
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