O ex-PM Ronnie Lessa afirmou nesta terça-feira (27) em audiência no STF (Supremo Tribunal Federal) que aceitou matar a vereadora Marielle Franco (PSOL) por ganância. Ele classificou o crime como uma asneira e se disse arrependido.
Lessa, que firmou delação premiada, voltou a dizer que foi contratado pelos irmãos Domingos e Chiquinho Brazão para executar o crime. Ele repetiu ter recebido como promessa de recompensa a exploração de terrenos na zona oeste do Rio de Janeiro, atividade que poderia lhe render, segundo afirma, R$ 25 milhões.
“Aquilo ali [possibilidade de ficar rico] me deixou impactado, me deixei levar ali. Foi ganância, me deixei levar. Eu nem precisava, realmente. Eu estava numa fase muito tranquila da minha vida. Minha vida já pronta, e eu caí nessa asneira. Foi ganância mesmo. Uma ilusão danada que eu caí”, afirmou Lessa na audiência virtual.
O ex-PM afirmou que chegou a pensar em desistir de cometer o crime em dezembro de 2017 após os irmãos terem proibido que o homicídio fosse cometido num trajeto tendo como origem ou destino a Câmara Municipal. “O que começa errado acaba errado.”
“Sou mega arrependido da besteira que eu fui fazer. Mas eu estou vivo. Sou testemunha viva de tudo o que aconteceu. Infelizmente não podemos contar com a presença do Macalé. […] Vou pagar o que eu devo, mas vou sair de cabeça erguida. […] Hoje consigo dormir, olhar para a cara da minha filha. Sei que tenho que pagar pelo crime, mas estou mais tranquilo.”
O colaborador afirmou ainda acreditar ter sido vítima de uma emboscada em abril de 2018, pouco mais de um mês após o crime. Na ocasião, um homem o abordou para roubar seu relógio e disparou contra ele. O ex-PM ficou internado cerca de 15 dias.
“Eu entreguei meu relógio e ele ia atirar na minha boca. Por instinto eu fiz assim [virei o rosto]. Fui baleado sem a mínima necessidade”, afirmou.
Lessa respondeu nesta terça apenas a perguntas da PGR (Procuradoria-Geral da República). Nesta quarta (28) ele continuará depondo para o Ministério Público, seguido dos advogados das vítimas e dos acusados. A expectativa é que a fala do ex-PM perdure por alguns dias da semana.
O delator confirmou os principais pontos de sua delação, firmada em agosto do ano passado.
Ele disse que as pesquisas sobre políticos do PSOL começaram a ser feitas em 2012. Os pedidos chegavam a ele por meio do PM Edmilson de Oliveira, conhecido como Macalé. A proposta para a execução do homicídio ocorreu, segundo ele, no fim de 2016, quando continuaram a pesquisar nomes ligados ao partido.
“A Marielle teve a infelicidade de aparecer negativamente para ele. Parecia que eles queriam dar uma pancada no PSOL”, disse Lessa.
Ele também reafirmou que os Brazão lhe garantiram o envolvimento do delegado Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro, no planejamento do crime. Lessa disse que as polícias do estado “estão contaminadas há décadas”.
“Talvez, se tivesse uma intervenção, uma coisa séria, se aparecesse um cara para denunciar provando que deu dinheiro a delegados, ia ter que abrir concurso. Seriam meia dúzia de gatos pingados que iriam sobrar. Essa é a realidade da Polícia Civil e na Polícia Militar. As polícias estão contaminadas há décadas”, afirmou.
Lessa depôs sem a presença virtual dos réus na sessão. Ele pediu a retirada dos acusados alegando se sentir desconfortável com a presença deles.
“Nós tínhamos um pacto de silêncio e ele foi quebrado. […] Não estamos lidando com pessoas comuns. São pessoas de alta periculosidade, assim como eu fui. Não me coloco como sendo mais perigoso que eles. No andar do depoimento vamos perceber que essas pessoas são mais perigosas do que se possa imaginar”, acrescentou Lessa.
O desembargador Airton Vieira, que conduz a audiência por delegação do ministro Alexandre de Moraes, acatou o pedido do delator. O ex-PM presta depoimento numa sala do presídio de Tremembé, em São Paulo, para onde foi transferido após firmar acordo de delação premiada com a PGR.
As defesas dos réus alegaram ser pouco crível que Lessa, apontado como um assassino de aluguel, pudesse temer a presença dos réus.
Italo Nogueira/Folhapress
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