A decisão do ministro Alexandre de Moraes de enviar a sua decisão de suspender a rede social X (antigo Twitter) para a Primeira Turma contrariou uma parte dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), que entende que o caso deveria ter sido levado ao plenário.
Moraes poderia ter optado por levar o caso direto para análise de todos os integrantes do Supremo, em vez de apenas a um grupo deles. Para que o caso fosse remetido ao plenário, um dos magistrados da turma deveria ter apresentado uma questão de ordem, o que não aconteceu.
Com a opção, Moraes sinalizou internamente que não pretende submeter a suspensão do X à análise de toda a corte.
A Primeira Turma é composta por cinco ministros e presidida pelo próprio Moraes. Além dele, integram o colegiado Luiz Fux, Cármen Lúcia, Flávio Dino e Cristiano Zanin. Já o plenário é formado pelos 11 integrantes do Supremo.
Ao enviar a sua decisão para ser validada pela Primeira Turma, Moraes buscou um ambiente no qual ele tinha segurança de garantir apoio unânime dos pares à sua ordem.
Na outra turma, estão os ministros que foram indicados ao STF pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL): Kassio Nunes Marques e André Mendonça.
Ambos têm discordado, integralmente ou em parte, de outras decisões de Moraes que tratam de temas relacionados a apoiadores do ex-presidente, como os processos sobre os ataques de 8 de janeiro.
Sob reserva, os ministros que demonstraram insatisfação com a atitude de Moraes de enviar o processo à Primeira Turma argumentam que uma decisão da magnitude da suspensão de uma rede social deveria ser analisada por toda a corte.
Também argumentam que, juridicamente, é incorreto enviar apenas à turma, já que o processo contra o X é um braço do inquérito das milícias digitais, que é de competência do plenário.
Nesta segunda (2), a Primeira Turma referendou de forma unânime a decisão de Moraes, mas o ministro Luiz Fux fez uma ressalva.
Para Fux, a decisão não pode atingir “pessoas naturais e jurídicas indiscriminadas e que não tenham participado do processo, em obediência aos cânones do devido processo legal e do contraditório”.
“Salvo se as mesmas utilizarem a plataforma para fraudar a presente decisão, com manifestações vedadas pela ordem constitucional, tais como expressões reveladoras de racismo, fascismo, nazismo, obstrutoras de investigações criminais ou de incitação aos crimes em geral”, sugeriu Fux.
A ressalva acontece porque Moraes decidiu, além de determinar a suspensão “imediata, completa e integral” do funcionamento da plataforma em todo o território nacional, fixar uma multa de R$ 50 mil a pessoas físicas e jurídicas que utilizarem de “subterfúgios tecnológicos”, como VPNs, para descumprir a decisão.
A questão relacionada à possibilidade de multa para quem acessar a plataforma por meio de VPN também é motivo de incômodo para outra parte dos ministros.
Um deles avalia reservadamente que o trecho a respeito do VPN envolve toda a sociedade. Por essa razão, acredita esse magistrado, o ideal seria que fosse deliberado pelo Legislativo, não pelo STF. A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) recorreu ao STF com pedido de revisão ou esclarecimento acerca da multa, alegando que a decisão é “desarrazoada”.
Outro ponto alvo de controvérsias na corte diz respeito à decisão de Moraes de bloquear as contas da Starlink. Assim como o X, a empresa tem Elon Musk como dono, mas funciona de maneira autônoma à rede social.
Uma ala de ministros do Supremo, inclusive aliados de Moraes, viram a determinação com ressalvas, por se tratar de uma companhia que opera de modo independente ao X. Como mostrou a coluna Mônica Bergamo, integrantes do STF avaliam que a ordem pode trazer insegurança jurídica. Por isso, ministros esperavam que o relator mudasse seu voto e submetesse também o caso ao referendo da Primeira Turma.
No lugar disso, Moraes reforçou seus argumentos para bloqueio das contas da Starlink no voto que apresentou na Primeira Turma.
Moraes disse entender que a Starlink, que provê serviços de internet via satélite para cerca de 250 mil assinantes, pertence ao mesmo grupo econômico do X.
O ministro determinou na sexta-feira (30) a derrubada “imediata, completa e integral” do funcionamento da rede social. A rede começou a saiu do ar no Brasil de forma gradual e, na tarde de sábado (31), a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) informou que já havia comunicado a todos os provedores de internet grandes, médios e pequenos.
A partir do aviso do órgão, as prestadoras têm até cinco dias para inserir todos os obstáculos tecnológicos para inviabilizar o uso do X e cumprir a ordem judicial. Na prática, a rede foi bloqueada pelas principais operadoras.
Julia Chaib/José Marques/Folhapress
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